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Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro lançam “Voz de Mágoa”

“A música brasileira anda desmoralizada. Coloquei esse nome para relembrar que ela existe” afirmou Caymmi

atualizado

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dori caymmi paulo cesar pinheiro
1 de 1 dori caymmi paulo cesar pinheiro - Foto: Reprodução/Youtube

Se emanassem um cheiro, as músicas de Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro teriam o odor singular de terra molhada pela chuva. O gosto seria o de fruta no pé; a cor, a da pele morena à sombra do lampião. As parcerias dos dois voltam a aguçar os sentidos no CD “Voz de Mágoa”, o quarto de Dori desde 2010 com poesias musicadas do amigo. O subtítulo, Música do Brasil, indica as intenções comuns.

“A música brasileira anda desmoralizada. Coloquei esse nome para relembrar que ela existe. Não só a minha, mas a dos que nos antecederam, meu pai, Tom Jobim, Noel Rosa, Ary Barroso. As pessoas não vão mais a shows para assistir, vão para botar mulher no ombro. Mas ainda tem gente ligada afetivamente a esse tipo de trabalho, que não tem divulgação. Encontro esperança quando me dizem na rua: ‘Você parece muito o Dori Caymmi'”, diz o músico.

“Fazemos essas músicas para que as pessoas não esqueçam do Rio nem do Brasil. A música de hoje é do corpo, não mais do espírito”, acredita Paulo, cujos versos ensinam que esse canto resistente, “mesmo triste”, “ameniza a dor do mundo”. “O que escrevo vem do nosso ‘mundo de dentro’ (título da música e do primeiro CD dos quatro). Misturo fazenda e mar. Na infância, vi passar gado e passar canoa. Como não posso estar mais nesses lugares, eles se mudaram para dentro de mim.”

Retorno
O disco, outro que sai pela Acari Records (de Luciana Rabello, mulher de Paulo), marca a volta do filho do meio de Dorival Caymmi ao Brasil, depois de 24 anos morando em Los Angeles. O trabalho por lá escasseou, a aporrinhação com os deslocamentos para o Brasil aumentou, e Dori, a despeito do mau momento nacional, resolveu retornar.

Mas não para o Rio, onde nasceu, em 1943, e que é chorado no CD em Padroeiro, alusiva ao assassinato cruel de um ciclista ocorrido na Lagoa Rodrigo de Freitas, cartão-postal da cidade, em 2015: “A mão da insensatez/ Já flechou o coração/ De São Sebastião outra vez/ O sangue vermelhou, tingiu/ E esse sangue que jorrou/ Manchou o Rio”.

Dori e a mulher, Helena, encantaram-se por uma casa na Região Serrana do Estado, a uma hora da capital. Em especial, por um rio que passa por ela. “Tem água limpa! Vou ficar bem isolado, tem muita coisa lá para me deslumbrar, caminhos para conhecer. Gosto de umidade, de neblina, me lembra Debussy, Ravel”, ele relata, em entrevista na Casa do Choro, foco de resistência da música brasileira aberto por Luciana há dois anos, no centro carioca.

“O Rio está dentro de mim. Mas o Rio de hoje não é o Rio em que eu nasci. Este Brasil não foi o que me prometeram. Em Los Angeles, já não estava trabalhando muito nos últimos 15 anos. Fui o único que fui para os EUA e continuei fazendo música brasileira. Mas agora queriam me ensinar a tocar violão. Eu toco assim há 40 anos…”, conta Dori.

Inspiração
A nova casa na serra poderia ter inspirado o CD. As 16 faixas – 13 com Paulo, duas póstumas, com Jorge Amado e Fernando Brant, e uma com Paulo Frederico e Pedro Amorim – remetem a um Brasil mais de beira de rio do que de mar. Um lugar cheio de afeições, algo saudosista, e que não conhece crise. Onde todo rio tem água cristalina, a brisa cheira a maresia e a cravo e a vida é serena O vozeirão à Caymmi e o violão não carecem de outras companhias

“Cada faixa tem uma letra, uma música e um violão”, ele define.

Ao contrário do que indica o título, não há mágoa, “só pena”, classifica Dori – “fazemos uma resistência alegre e pacífica”. A dupla não acredita na suposta morte da canção. “Muitos dizem, hoje em dia/ Que a canção vai se acabar/ A canção quem faz é o vento/ É o pássaro no ar/ É o som da cachoeira/ É o ritmo do mar”, aponta “Canção sem fim”, que conclui: “Enquanto houver gente/ vai haver canção de amor”.

As composições dos amigos vêm desde 1969, e são descritas por Maria Bethânia – intérprete da talvez mais conhecida delas, É o Amor Outra Vez – como “um encontro de pura luz”, “saúde de já poder dizer só o que mais interessa”. Já somam uma centena, mais de 20 prontas na gaveta. Nos últimos anos, a dinâmica tem sido assim: Paulo manda as letras para Dori musicar por Luciana. Ela as envia para Helena. Autodefinidos “trogloditas”, eles não têm e-mail nem usam celular.

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