Já faz um bom tempo que produções recentes do cinema português têm ganhado espaço privilegiado no Cine Brasília. “O Ornitólogo”, de João Pedro Rodrigues, mantém essa tradição. É um filme singular e estranho. No bom sentindo, é claro.
Apesar de já ser conhecido por trabalhos mais polêmicos como “O Fantasma” (2000) e “Morrer Como Um Homem” (2009), é bem capaz de esse filme ser a primeira experiência do público com o universo surpreendente do diretor. Atração da 24ª edição do Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade (2016), a fita narra as experiências para lá de inusitadas do ornitólogo do título numa floresta com clima soturno e misterioso.
O nome dele é Fernando (Paul Hamy) e, como a profissão indica, estuda a rotina dos pássaros. Um belo dia, a procura de uma espécie rara no Picão do Diabo, paradisíaca gruta localizada numa região próxima ao rio Douro, no norte de Portugal, ele se distrai com o binóculo, com o pássaro e é levado correnteza abaixo, se perdendo. Mais tarde é encontrado por uma dupla de peregrinas chinesas cristãs, igualmente extraviadas do caminho de Santiago de Compostela.
“São Tiago nos abandonou”, desespera-se uma delas com crucifixo na mão, emendando um Pai-Nosso em mandarim.
Suspense com ares de misticismo
A partir desse encontro excêntrico no meio de uma floresta com ares de filme de terror, tudo muda na narrativa que parece normal e descamba para um suspense cheio de misticismo. As gurias orientais salvam o ornitólogo, mas diabólicas que são, lhe dão uma rasteira.
Ele sai do espeto para cair na brasa e essa situação parece uma constante na jornada de Fernando. Toda vez que tenta se salvar, encontra-se em uma encrenca ainda maior.
“Tem coisas que não vale a pena entender, acontecem”, filosofa ele após inúmeras experiências surreais que vão desde presenciar um ritual macabro na calada da noite ou rolar nu na areia abraçado com um jovem surdo-mudo de nome Jesus. E o que são aquelas lindas amazonas de belos seios de fora?
Surrealista, espiritualista e surpreendentemente diferente, a trama de “O Ornitólogo” suscita reflexões para além da compressão humana. Flerta com Shakespeare, J. J. Benítez (“Operação Cavalo de Tróia”), parábolas bíblicas e velados temas ecológicos para falar de homossexualidade, transcendência espiritual, enfim, descobertas. É uma produção com rompantes sensoriais. O final é simples e exemplar.
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Avaliação: Ótimo