A China é pop: de Mulan a Shang-Chi, Hollywood abraça cultura oriental

Enquanto a Disney investe pesado em megaproduções, blockbusters e filmes cult chineses chegam com mais frequência a serviços de streaming

Felipe Moraes
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Desde talvez os tempos de Bruce Lee, nos anos 1970, a China não era tão pop por aqui no nosso cantinho ocidental do planeta. Basta espiar o calendário da Disney para os próximos anos: estreias do remake live-action de Mulan com elenco asiático (26/03/2020) e de Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis (11/02/2021), primeiro filme solo do super-herói oriental da Marvel.

Inegável potência econômica e industrial, o país representa, sobretudo na década de 2010, mercado decisivo para o desempenho dos filmes “globais” de Hollywood. Sobram exemplos. Mas fiquemos com a maior bilheteria de todos os tempos (US$ 2,796 bilhões), Vingadores: Ultimato.

Do montante, os Estados Unidos obviamente lideram, com US$ 858 milhões. Mas US$ 614 milhões vieram da vice, a China continental (excluindo da relação Hong Kong, Macau e Taiwan): a quantia responde pela quarta maior cifra cinematográfica em solo chinês.

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Simu Liu na Comic-Con 2019: estrela do filme solo do super-herói Shang-Chi, mestre do kung fu
Tony Leung em Amor à Flor da Pele (2000), do cultuado diretor Wong Kar-Wai: astro também estará em Shang-Chi
Leung também ficou famoso no ocidente por Conflitos Internos (2002): a franquia inspirou Os Infiltrados (2006), longa de Martin Scorsese vencedor do Oscar
Constance Wu e Gemma Chan em Podres de Ricos (2018), a comédia romântica mais lucrativa da última década, com US$ 238 milhões arrecadados no mundo. Chan interpretou Minn-Erva em Capitã Marvel (2019) e será Sersi em Os Eternos
Li Bingbing e Jason Statham: par romântico em Megatubarão (2018)
The Farewell (2019): filme é apontado como concorrente ao Oscar 2020. Ainda não tem distribuidora ou data de estreia definida no Brasil
Filme Podres de Rico retrata a cultura asiática
Yifei Liu no papel principal em Mulan: um dos filmes mais aguardados da Disney em 2020

De quebra, blockbusters chineses, antes um tanto obscuros, têm chegado com mais frequência, via plataformas de streaming, para plateias do lado de cá do mundo, bem como os principais nomes do star system chinês. A ala cult, simbolizada pela peculiar produção de Hong Kong, também se mostra um tantinho acessível por meio de canais digitais.

Disney e além

Um olhar sobre a recém-anunciada safra de produções da casa do Mickey para cinema e televisão – ou melhor, Disney+, o streaming do estúdio – sinaliza como a representatividade asiática anda à toda na indústria norte-americana.

Os Eternos, filme-chave da Fase Quatro do MCU (Universo Cinematográfico Marvel), traz direção da chinesa radicada nos Estados Unidos Chloé Zhao, responsável pelo hit alternativo Domando o Destino (2017), e elenco bastante diversificado. Da Ásia, vêm Kumail Nanjiani, comediante de origem paquistanesa conhecido por Doentes de Amor (2017), o sul-coreano Dong-seok Ma, revelado em Invasão Zumbi (2016), e a inglesa de ascendência chinesa Gemma Chan, do sucesso indie Podres de Ricos (2018).

O filme solo de Shang-Chi também respira autenticidade, ao menos no papel. Com direção do havaiano Destin Daniel Cretton (Temporário 12), filho de mãe japonesa, a escalação reúne, por ora, três nomes anunciados oficialmente: o chinês radicado no Canadá Simu Liu na pele do mestre do kung fu, Awkwafina, atriz de origem chinesa e sul-coreana destacada em Oito Mulheres e um Segredo (2018), Podres de Ricos e no ainda inédito no Brasil The Farewell, e o astro de Hong Kong Tony Leung, celebrado por filmes cult como Amor à Flor da Pele (2000) e Conflitos Internos (2002).

Mais aguardado ainda pelo público é Mulan, a versão com atores do desenho de 1998. O elenco é um desfile de estrelas do cinema chinês: Li Gong (do clássico Lanternas Vermelhas), os especialistas em artes marciais Jet Li, já conhecido do público ocidental, e Donnie Yen, nome da franquia épica O Grande Mestre (Ip Man, em inglês) e lembrado pelos fãs de Star Wars por ter encarnado o guerreiro cego Chirrut Îmwe em Rogue One (2016), e Yifei Liu como protagonista, entre outros artistas.

Para além dos blockbusters e radar do Oscar 2020

A tendência, claro, não se restringe ao catálogo (parrudo) da Disney. Ano passado, por exemplo, Jason Statham, em alta com Velozes e Furiosos: Hobbs e Shaw, fez par romântico com a cantora popular e atriz Li Bingbing no thriller de monstro gigante Megatubarão. Bao, curta da Pixar vencedor do Oscar, quebrou tabu ao se tornar o primeiro título da produtora a ser dirigido por uma mulher, Domee Shi.

A comédia mais comentada de 2018 foi a já citada Podres de Ricos, com direção de Jon M. Chu (G.I. Joe: Retaliação, franquias Truque de Mestre e Ela Dança, Eu Danço) e nomes como Michelle Yeoh (O Tigre e o Dragão), Ken Jeong (Se Beber, Não Case!) e Constance Wu (Fresh Off the Boat) no elenco.

Também tem filme no radar do Oscar 2020. The Farewell, comentado parágrafos atrás, ocupa a sétima posição entre os filmes mais elogiados do ano no site Metacritic, que agrega opiniões da imprensa especializada, e pode emplacar indicações importantes à estatueta. Na trama, história de inspiração autobiográfica da diretora e roteirista chinesa radicada na Flórida Lulu Wang: uma família descobre que a matriarca, com câncer terminal, está prestes a morrer e decide organizar um casamento improvisado para juntar os parentes em clima festivo.

Blockbusters da China e filmes cult de Hong Kong

Outro dia destacamos aqui Terra à Deriva, filme “intruso” entre as maiores bilheterias de 2019, com US$ 699 milhões arrecadados. Em sétimo lugar no top 10, a ficção científica já tem concorrente doméstico no retrovisor: a animação Ne Zha, perto da barreira dos US$ 700 milhões.

A robustez econômica do país nos últimos anos se revela de maneira acachapante nas maiores cifras de todos os tempos em cinemas do país. Na lista dos 50 longas mais endinheirados da história, frequentada por produções de Hong Kong, China e EUA, todos os sucessos são de 2010 para cá.

E vários deles chegaram recentemente a catálogos de streaming, sobretudo a Netflix. Além de Terra à Deriva, segundo na relação, hits como Wolf Warrior 2 (2017), líder do levantamento (US$ 874 milhões), Sequestro no Mar Vermelho (2018), quinto colocado, e As Travessuras de uma Sereia (2016), sétimo.

Atualmente em atmosfera de tensão com a China por causa de constantes e numerosas manifestações de rua, Hong Kong, região administrativa do país, é dona de um cinema riquíssimo e bem diferente da terra-mãe, ainda fechada à diversidade (artística, social, sexual, cultural e política). Não à toa, foi tema de mostra nos CCBBs em 2018 e exportou diretores (John Woo, Tsui Hark) e atores (Jackie Chan, Chow Yun-fat), sobretudo entre os anos 1980 e 1990.

Dá para encontrar vários desses filmaços cult em plataformas de streaming. Eis uma dica cinéfila preciosa: usar nomes de alguns desses cineastas nas ferramentas de busca, como Johnnie To (Infiltrado, no trailer acima, e Lifeline), Chang Cheh (Os Cinco Venenos de Shaolin), Stephen Chow (O Monge Trapalhão), Herman Yau (A Home With a View, recém-chegado à Netflix), Lau Kar-leung (A Câmara 36 de Shaolin) e Soi Cheang (Motorway).

Falando em streaming, voltemos a Bruce Lee, nome maior das artes marciais no cinema. Parte de seus filmes, como O Voo do Dragão (1972) e O Dragão Chinês (1971), pode ser acessada na Amazon Prime Video e estreia em outros espaços digitais (Apple TV, Google Play, Now, Vivo Play e YouTube) em 18 de setembro.

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