Antes de ser assassinada, Simone foi trancada em casa pela mãe

Mulher não queria que a filha se encontrasse com o suspeito do feminicídio, Josias Sacramento. Vítima foi enterrada nesta quarta (5/9)

Victor Fuzeira ,
Ana Luiza Vinhote
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O relacionamento abusivo entre Simone de Sousa Lima, de 26 anos, e o seu algoz, Josias Sacramento dos Santos, 40, indicava que o 21º caso de feminicídio do Distrito Federal era uma tragédia anunciada. As recorrentes ameaças e agressões sofridas pela jovem fizeram com que sua mãe a trancasse em casa para evitar que ela fosse ao encontro do suspeito, diz o delegado-cartorário da 33ª Delegacia de Polícia (Santa Maria), Paulo Fortini.

Segundo o delegado, apesar da medida protetiva e das ocorrências registradas contra o homem, Simone costumava procurá-lo. “Não sabemos se era porque ela gostava realmente dele ou se era por medo, pelas ameaças, mas ela não ia às audiências convocadas e o encontrava, mesmo contra a vontade da família.”

Fortini relatou que na segunda-feira (3/9), momentos antes de ser morta, as irmãs da vítima a alertaram do perigo iminente. “Falaram para Simone não ir, mas ela não as ouviu”, contou.

Enterro
Simone foi enterrada nesta quarta-feira (5), sob forte comoção. Cerca de 60 pessoas, entre parentes e colegas, se despediram da mulher no Cemitério do Gama. A mãe dela, muito abalada, ficou o tempo todo ao lado do caixão em que estava a filha. A família pediu que a imprensa não se aproximasse.

Marizete Freitas, 50 anos, ex-cunhada de Simone, disse que as agressões eram constantes. “Eles separavam e voltavam. Fiquei sabendo que ela tinha uma medida protetiva, mas não adiantou, né? Ela era muito tranquila e brincalhona. Falava abertamente das agressões e marcas no corpo. A família está muito abalada”, contou a irmã do primeiro marido de Simone.

Amiga de uma prima de Simone, Natália Cotrim, 50 anos, se revoltou com a situação. “Não há segurança e o sentimento de impunidade é o que fica. O homem está solto e Santa Maria é um ovo. Aí, ele sai do flagrante e vai responder em liberdade. Podia ser com qualquer uma, todas nós estamos sujeitas a esse tipo de barbaridade”, criticou.

 

Francisco das Chagas, 48 anos, conhecia Simone desde pequena. “Ela era muito gente boa. Eu não sabia que ela passava por essa situação”, disse.

Crime
A mulher teria sido chamada por Josias para ir à residência dele naquela manhã. No mesmo dia, de acordo com o delegado, os dois participariam de uma audiência sobre a medida protetiva concedida pelo Juizado de Santa Maria contra o suspeito.

Por volta das 6h, Simone foi brutalmente assassinada com pelo menos oito golpes de facão, um deles teria atingido a veia femoral na perna esquerda. O delegado-chefe Rodrigo Têlho acredita que houve luta corporal entre os dois. “Encontramos manchas de sangue nas paredes e estamos aguardando o resultado final dos laudos para traçar a dinâmica do crime”.

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Josias e Simone
Segundo familiares, Simone estava grávida do segundo filho do casal
O assassinato ocorreu na QR 517 de Santa Maria
Delegado Paulo Fortini diz que a mulher levou pelo menos dois golpes de facão
Residência onde ocorreu a tragédia
Peritos trabalham na cena do crime

Espancamentos
Há oito meses, os episódios de agressões levaram a locatária Alzenir Pereira Veras, 67, e o marido a pedirem de volta o quarto onde Josias morava de aluguel. “Era uma dor de cabeça muito grande. A gente mora ao lado e dava para escutar as discussões. Eu a ouvia sendo espancada. Toda semana era uma briga.”

À reportagem, a dona do imóvel confirmou que era constantemente questionada por oficiais de Justiça sobre a presença da moça no local. “Não mentia. Ela chegou até a morar aqui com o filho”, afirmou. Segundo Alzenir, em uma das ocasiões, Josias expulsou Simone de casa. “Ele até pediu para o meu marido trocar a fechadura, mas deu meia-noite e ela estava aqui na porta de novo.”

A aposentada relatou ter aconselhado a vítima a romper com o namorado. “Disse para ela sair dessa vida, porque não merecia. Cansei de vê-la chorando, é tudo muito triste”, lamentou.

Tráfico de drogas
A rotina dos dois teria se alterado desde a última mudança. De acordo com o filho do dono da quitinete na qual o homem passou a morar, nos últimos três meses, Simone teria procurado o algoz apenas na madrugada do assassinato.

No entanto, o comportamento do inquilino já havia chamado a atenção do proprietário. “O meu pai avisou: ‘pelo seu estilo de roupa já sei que você mexe com coisa errada’, mas como ele nunca deu problema, a gente não fez nada”, lembrou o filho, cuja identidade foi preservada.

Segundo o rapaz, o pai viu o momento em que Josias saiu correndo e deixou o imóvel aberto. Ele achou estranho, entrou na casa e viu o corpo da mulher no chão.

Depois do crime, os policiais encontraram resquícios de cocaína sobre uma mesa, na sala da residência. De acordo com o delegado, Josias era “suspeito de traficar na região”.

Quatro quitinetes e uma casa dividem o terreno da QR 517, Conjunto C, Casa 18, em Santa Maria. O valor mensal do aluguel era de R$ 450. “Foi uma surpresa. Sempre pagava em dia e não demonstrava ser agressivo”, disse o rapaz.

Tragédia
Em conversa com o Metrópoles, na manhã dessa terça (4), uma prima de Simone lembrou que o caso era uma tragédia anunciada. Simone deixou dois filhos, um deles com 2 anos, fruto do relacionamento com Josias, quatro irmãs e os pais. “Eles estão transtornados”, ressaltou a jovem, por meio de uma conversa pelas redes sociais.

Até a última atualização desta reportagem, o paradeiro de Josias ainda era desconhecido pela Polícia Civil. Natural da Bahia, ele chegou a pedir ajuda ao cunhado e a irmã para fugir, mas recebeu uma negativa do casal. Os investigadores suspeitam que tenha fugido para o estado, onde mora a maior parte da família.

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