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Líderes de seita do DF acusados de trabalho escravo faltam audiência

Seria o primeiro encontro de acusados com procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT)

atualizado

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Vinicius Santa Rosa/Metrópoles
Seita-21
1 de 1 Seita-21 - Foto: Vinicius Santa Rosa/Metrópoles

Acusados de manter crianças e adolescentes em regime de trabalho escravo, os representantes das empresas ligadas à Igreja Adventista Remanescente de Laodiceia faltaram à primeira audiência com procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) sobre o assunto. O encontro deveria ter acontecido na Vara do Trabalho do Gama (DF), na última segunda-feira (01/07/2019).

Ana Vindoura, tida como líder da seita religiosa mantida em uma fazenda do Gama, Luciclei Rosa da Silva, Márcia Cristina Cardoso, Márcia Morais de Rezende e Lúcio de Faria Silva Alves já tiveram suas contas bloqueadas pela Justiça, em março deste ano, para garantir pagamento dos jovens forçados a trabalhar.

As vítimas ficavam encarceradas em uma chácara às margens da DF-290, no Gama, e só foram descobertas após a Polícia Civil resgatar uma moça de 18 anos do lugar.

Eles são apontados pelo MPT como vinculados às empresas Folha de Palmeiras Comércio e Indústria de Alimentos Ltda. e Universal Empreendimentos Imobiliários Ltda, ambas com operações relacionadas à chácara, onde a Polícia Civil do DF (PCDF) resgatou uma moça de 18 anos em janeiro deste ano.

Operação

As supostas irregularidades na Igreja Adventista Remanescente de Laodiceia começaram a se tornar públicas em 7 de janeiro deste ano, quando a 20ª Delegacia de Polícia (Gama) revelou ter resgatado, 10 dias antes, uma jovem de 18 anos mantida em cárcere privado no local. Na ocasião, Ana Vindoura chegou a ser presa.

O episódio encorajou outras pessoas a delatarem a seita. Chegaram à unidade policial e em outros órgãos denúncias de crianças impedidas de frequentarem a escola, de pessoas submetidas a trabalhos forçados e mantidas em alojamentos precários.

Diante da gravidade das denúncias, a 20ª DP, o Ministério Público Federal (MPF), auditores ficais do Ministério Público do Trabalho (MPT), o Conselho Tutelar do Gama e a Subsecretaria de Políticas para Crianças e Adolescentes da Secretaria de Justiça e Cidadania do DF deflagaram uma operação a fim de investigar se pessoas estavam sendo submetidas a situações análogas às de escravo na propriedade rural.

No local, foram encontrados ao menos 79 trabalhadores em condição degradante de trabalho e de vida. A operação resultou na interdição dos alojamentos usados pelos fiéis e das áreas de panificação e hortaliça.

O auditor fiscal do trabalho Rodrigo Ramos do Carmo diz que várias anotações com a contabilidade das atividades desenvolvidas na chácara foram apreendidas e estão sendo analisadas. “Vamos fazer uma estimativa de quanto a líder religiosa arrecadava. O fato é que o custo para ela era mínimo, só de matéria-prima e energia elétrica, pois a igreja tinha a função de manter a mão de obra sem custos”, ressalta.

Segundo ele, a situação que os seguidores dela viviam era indigna, o que levou a força-tarefa a tomar medidas duras. “Lá, havia equipamentos de última geração para a fabricação de pães e as máquinas de costura tinham até leitor digital. No entanto, os trabalhadores desenvolviam suas funções não remuneradas em banquinhos de plástico e sem encosto”, detalha.

Também chamou atenção do auditor os dormitórios dos seguidores da seita. “Pessoas passavam a noite em carrocerias de caminhões ou sob estruturas de lonas que eram compartilhadas por homens, mulheres e crianças. Um desses alojamentos ficava ao lado de um depósito de agrotóxico. Fechamos tudo.”

Investigação

Durante os meses de janeiro e fevereiro, investigadores da 20ª DP se debruçaram para analisar dezenas de denúncias que chegavam à unidade policial, algumas relacionadas a cárcere privado, crianças não matriculadas na rede de ensino, entre outras.

A apuração corre em sigilo. Segundo a delegada Érika Costa, há desde 2016 relatos de condutas criminosas praticadas na comunidade, mas obstáculos dificultavam o flagrante policial naquela época. “Seja pelo temor que as vítimas demonstravam ter de represálias por parte da líder religiosa e de seus obreiros, seja pela própria conduta destes em burlar e embaraçar a ação policial”, destaca Érika.

De acordo com a delegada, trata-se de uma investigação complexa pelo fato de a maioria dos integrantes – e das vítimas – da seita ser de boa índole e aparentemente não consciente de direitos elementares. “A liberdade e a fé são garantidas pela Constituição, mas esses direitos não podem violar outros, como trabalhistas e o de ir e vir”, ressalta.

 

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