Iges-DF nega negligência em atendimento a jovem com síndrome de Down em UPA

Jovem com síndrome de Down morreu após diversas complicações. Família aponta negligência e preconceito no atendimento do paciente

Jade Abreu ,
Nathália Cardim
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Após a mãe denunciar o atendimento ao filho com síndrome de Down, Warlley Eduardo Pires, de 30 anos, que morreu em uma unidade da rede pública de saúde do Distrito Federal, o Instituto de Gestão Estratégica do DF (Iges-DF) negou ter havido negligência médica no primeiro contato com o paciente na unidade de pronto atendimento (UPA) do Setor O.

“O Iges-DF esclarece que foram realizados todos os procedimentos possíveis para atender o paciente”, afirmou por meio de nota enviada ao Metrópoles. O Iges-DF ainda informou que e abriu uma sindicância interna para apurar os fatos relacionados ao atendimento do paciente.

O calvário da família Pires começou na quinta-feira da semana passada (9/3). Em vídeos, é possível ver o rapaz se debatendo no chão da unidade de pronto atendimento (UPA II ), no Setor O. Os profissionais de saúde viam a cena e passavam pelo paciente, sem demonstrar qualquer preocupação. Maria de Lourdes Pires, 50, mãe de Warlley, informou que, minutos após o registro das imagens, ele começou a perder os sinais vitais. “Morreu nos meus pés”, desabafou a diarista.

No atestado de óbito, uma das causas da morte deixou a família revoltada. O documento listava insuficiência renal, pneumonia, diabetes e síndrome de Down como motivo da fatalidade.

Veja vídeo:

O Iges-DF explicou explica que o paciente deu entrada na UPA de Ceilândia II, no dia 9, às 8h50, levado pelo  Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) devido a um quadro de convulsão e febre no dia anterior, avaliado e classificado com gravidade laranja.

“Foram realizados exames laboratoriais e raio X, iniciado antibiótico venoso. O paciente evolui com agitação psicomotora, foi administrado medicamento conforme quadro clínico apresentado. Por volta das 14h10, evoluiu com rebaixamento do nível de consciência, encaminhado para sala vermelha para melhor avaliação, sinais vitais e exames laboratoriais”, diz o Iges-DF.

Após o quadro evoluir em parada cardiorrespiratória, às 14h20, segundo o Iges-DF, os médicos iniciaram as manobras de reanimação e intubação orotraqueal.

“Meu filho não tinha aquele comportamento, e eu falava ‘moço, meu filho não está bem”, lembrou a mãe. Apesar das súplicas, Warlley recebeu alta às 14h20, conforme consta no prontuário. Com a liberação médica, ela chega a sair do hospital, mas na porta se arrependeu e voltou com o filho para dentro da UPA.

Nesse momento, a mãe disse que foram levados para a “sala verde”, onde aguardaram por um leito. Warlley, então, deitou no chão e se debateu. A mãe clamou por ajuda, mas, segundo ela, foi ignorada. “Eu via que ele estava morrendo”. Maria de Lourdes contou que só quando o filho perdeu a consciência uma enfermeira identificou o agravamento do caso.

“Após 30 minutos, restabeleceu circulação espontânea, acoplado ao ventilador mecânico e submetido a medicamentos. Apresentou nova PCR, novamente restabelecida circulação central. Ele foi prontamente inserido em leito de regulação, com solicitação de leito de UTI. O leito de UTI foi disponibilizado no Hospital Regional de Samambaia (HRSam) e o paciente foi transferido às 23h45 do mesmo dia”, conclui a nota.

O caso

O rapaz registrava febre de 39ºC e diarreia havia quatro dias, com vômitos desencadeados por tosses intensas. A família buscou atendimento em uma unidade básica de saúde (UBS III) de Taguatinga, onde foi orientada a procurar uma UPA de Vicente Pires, onde foi confirmado o quadro de pneumonia e glicemia alta. Medicado, o rapaz recebeu alta e foi para casa.

Ao Metrópoles mãe contou que, quando o médico do HRSam recebeu Warlley para atendimento, já informou que o estado de saúde do paciente era grave. “Ele me disse que meu filho não iria resistir e que já veio com um quadro de morte”. Às 5h40 do dia 10/3, o óbito foi declarado.

A família registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) nessa segunda-feira (13/3), na 24ª Delegacia de Polícia (Ceilândia) que investiga a possível omissão médica nos socorros. Um amigo da família disse que “ele se debatia porque estava morrendo”. No vídeo, é possível ver os profissionais da saúde passando por Warlley e observando a cena enquanto a mãe pede para que o rapaz seja amparado.

Sobre Warlley

De acordo com familiares e amigos, Warlley era um jovem tranquilo e muito divertido. Ele estudava do Centro de Ensino Especial 1, de Taguatinga, e participava da Banda Acorde.

Veja vídeo de uma das apresentações do homem:

 

Revoltada com o caso, a Associação DFDown manifestou nota de repúdio sobre a forma com que Warlley foi atendido. “Imagens e depoimentos aos quais integrantes e diretoria da Associação tiveram acesso dão indícios de negligência e capacitismo inadmissíveis, sobretudo em se tratando de profissionais da saúde dos quadros da administração pública”, diz a nota.

O documento pontua, ainda, que a “a vida de um homem de 30 anos foi perdida em razão de evidente descaso, imperícia e preconceito”. A associação reforça que as autoridades devem investigar as causas da morte e punir os responsáveis.

Em nota, a Secretaria de Saúde do DF informou ao Metrópoles que o paciente chegou no Hospital Regional de Samambaia (HRSam) com suspeita de morte encefálica, sendo rapidamente atendido na UTI do hospital por conta da gravidade do quadro. Segundo a secretaria, o paciente foi admitido às 0h5 e veio a óbito às 05h48.

O Metrópoles tentou contato com a Secretaria de Saúde do DF, mas, até a última atualização desta reportagem, nenhum posicionamento havia sido emitido. O espaço segue aberto para possíveis manifestações.

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