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Fraude na Saúde: contrato para UBS na gestão Agnelo foi superfaturado

Segundo o MP, ex-secretários Rafael Barbosa e Elias Miziara teriam inflado valores para construção de 13 unidades básicas

atualizado

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André Borges/Esp. Metrópoles
Greve Geral
1 de 1 Greve Geral - Foto: André Borges/Esp. Metrópoles

A suposta organização criminosa denunciada no âmbito da Operação Contêiner inflou o valor de um contrato de compra de unidades básicas de saúde (UBS). A Secretaria de Saúde (SES-DF) teria orçado a construção de oito módulos ao preço de R$ 12.849.235,20. No entanto, segundo o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organização (Gaeco), do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), a pasta desembolsou R$ 32.194.809,88 por 13 UBS.

Ademais, as fraudes na aquisição de material de construção geraram prejuízo de R$ 349,1 milhões aos cofres públicos do DF. Ao longo da apuração, os investigadores colheram relatos de engenheiros da pasta que teriam questionado o fato de o governo obter, com recursos públicos, unidades de “lata”, dispensando edificações de alvenaria.

O MPDFT apresentou a denúncia contra 11 pessoas à 1ª Vara Criminal de Brasília nessa segunda-feira (29/07/2019). Entre os denunciados estão os ex-secretários de Saúde Rafael Barbosa e Elias Miziara.

Conforme consta na ação penal, inicialmente estavam previstas obras para oito UBS de 5.387,52 metros quadrados cada. Ao final do processo, mais cinco centros foram adicionados ao contrato, totalizando 13 módulos de 10.665,76 m² cada. A alteração documental foi executada na gestão de Rafael Barbosa, que comandou a pasta durante o mandato de Agnelo Queiroz (PT). O ex-governador não é réu neste processo.

No quadro abaixo, veja os valores e as metragens previstas inicialmente e o acertado ao final do processo:

Reprodução/ MPDFT

Em despacho supostamente adulterado a fim de justificar a elevação abrupta do contrato, a própria assessoria jurídica e legislativa da Secretaria de Saúde teria classificado o documento como “ininteligível”. De fato, na análise dos materiais investigados, as movimentações do grupo despertaram diversas críticas dentro do Governo do Distrito Federal (GDF).

“A despeito das sérias ressalvas feitas pela Coordenação Geral de Engenharia da SES-DF, que principiavam pelo fato de estar-se preterindo as construções tradicionais de alvenaria para se erguerem unidades de ‘lata’ e que impunham no mínimo a realização de estudos, o aprimoramento e melhor instrução do feito”, contaram os investigadores. De acordo com a ação penal, as unidades também apresentavam deficiências evidentes.

Veja um dos trechos:

Reprodução/ MPDFT

Adulteração

Na análise de outra contratação, iniciada em 2009, ainda no governo de Rogério Rosso (PSD) – que não é investigado no processo –, o MPDFT afirmou ter havido adulterarão no valor do metro quadrado do projeto. O preço inicial era de R$ 2.385,00. No entanto, a suposta organização teria elevado o valor para R$ 3.018,52, configurando um superfaturamento de 26,5%. Pelo patamar original, o Estado iria desembolsar R$ 15,2 milhões, mas a manobra do grupo, conforme as investigações, fez com que a fatura ficasse em R$ 19.209.861,28. Em montantes atualizados para 2019, o prejuízo é de R$ 72.865.589,47.

Segundo a ação penal, os acusados formularam uma ata de preço no Rio de Janeiro para usarem a empresa conhecida como Metalúrgica Valença no suposto esquema de fraudes. Neste contexto alguns membros do grupo teriam fraudado documentos, assinando-os como representantes do município carioca.

 

Conforme a apuração do Gaeco, em uma concorrência, a empresa Eurobras teria oferecido uma proposta mais econômica do que a da Valença. De acordo com os autos, a concorrente forneceu módulos para a montagem das unidades de saúde a R$ 2.365,94 por metro quadrado. Ou seja, preço inferior àquele formulado na ata de registro de preço da Valença, de R$ 2.382 pelo metro quadrado.

“Em sua proposta, aliás, a Eurobras informou que já estava incluso o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)”, destacaram os investigadores. Caso a proposta fosse aceita, representaria economia de R$ 238.428,21. Na época, Miziara era secretário-adjunto de Saúde. Segundo o MPDFT, neste caso, o denunciado atuou de forma decisiva para a contratação ilegal “com o unívoco interesse de beneficiar a Metalúrgica Valença com outro acerto milionário”.

Reprodução/ MPDFT

 

 

Além de Barbosa e Miziara, também foram denunciados: Ronald de Carvalho, Cláudio Albuquerque Haidamus, Edcler Carvalho Silva, Fernando Cláudio Antunes Araújo, Marcelo Marcos de Castro Carvalho, João Vilson Bezzi, Berardo Augusto Nunan, José de Moraes Falcão e Flávio Rogério da Mata Silva. De acordo com o Gaeco, Ronald, Cláudio e Edcler seriam os líderes da suposta associação criminosa.

Outro lado

O advogado de Rafael Barbosa, Kleber Lacerda, em nota enviada à reportagem, classificou a acusação como uma “aberração”. “A Operação Contêiner, por si só, é uma aberração. A matéria em questão já foi objeto de ação de improbidade administrativa, julgada pela 2ª Turma Cível, tendo o TJDFT [Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios] asseverado que inexistiu improbidade administrativa. Como poderia, então, o Ministério Público concluir pela responsabilização criminal, sem sequer existir responsabilidade civil?”, questiona o defensor.

Já a defesa de Miziara, também em nota, alegou que o TJDFT já havia afastado qualquer tipo de responsabilidade de seu cliente. “O próprio Tribunal de Justiça do DF, em sentença e acórdão em ação de improbidade, ajuizada antes também pelo próprio Ministério Público, já afastou sua responsabilidade pelos mesmos fatos que a ação penal ora ajuizada insiste em reproduzir. Com efeito, e é o que se espera novamente aconteça, o próprio TJDFT já reconheceu antes a ausência de ilegalidade ou de superfaturamento na contratação, bem como a inexistência de dolo em causar dano ao erário ou de se enriquecer ilicitamente”, sustentou Joelson Dias.

A reportagem não conseguiu localizar os demais citados na denúncia do MPDFT.

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