Trabalhador do DF gasta, pelo menos, 20% do salário com impostos

Cálculo é feito por ferramenta da ONG Oxfam Brasil, com base na renda média divulgada pelo IBGE

Iana Caramori
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Nem tudo o que se recebe após um mês de trabalho vai para o bolso do trabalhador. Boa parte dos rendimentos é destinada a impostos, que não são poucos. Mas a porcentagem exata de quanto o brasileiro paga em tributos pode não ser de conhecimento de toda a população.

Para ajudar a esclarecer quanto do salário vai para os cofres do governo, a ONG Oxfam Brasil lançou uma calculadora tributária on-line. A ferramenta permite que o trabalhador saiba quanto paga de impostos de acordo com a renda mensal — incluindo salário, aluguel, aplicações e outras fontes.

Para o cálculo, foram considerados dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) — ambos medidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) — e os grandes números das Declarações de Imposto de Renda de Pessoas Físicas (DIRPF), da Receita Federal. Além de apontar a porcentagem de quanto o trabalhador contribui em um mês, a calculadora mostra o que é possível financiar por ano, direta ou indiretamente, como gastos com educação fundamental e saúde pública.

De acordo com a Oxfam Brasil, a média de contribuição com impostos da população brasileira é de 19% da renda. Esse índice aumenta para 28% entre os 5% dos brasileiros com menor renda, que recebem entre R$ 265 e R$ 570. Por outro lado, os cidadãos com 0,2% de renda mais alta no país, cujos rendimentos médios chegam a R$ 175 mil, contribuem com apenas 7% da renda em impostos.

Considerando o rendimento médio mensal do DF — de R$ 3.908, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada também pelo IBGE —, o brasiliense paga, em média, 20% do salário em impostos, ou seja, R$ 781,60.

Essa quantia possibilitaria financiar quatro estudantes da educação fundamental; quatro atendimentos na saúde pública; 226 metros quadrados de vias pavimentadas; 276 quilos de lixo coletados e 745 pontos de iluminação pública. A calculadora aponta ainda que 15% dos brasileiros têm a renda igual ou maior que a média para o DF.

Por região administrativa

No Distrito Federal, a distribuição de rendimento domiciliar é medida pela Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (Pdad), divulgada pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan). O estudo aponta a diferença salarial entre os moradores das regiões administrativas da capital.

A maioria dos trabalhadores do Plano Piloto, por exemplo, recebia em 2018 mais de 20 salários mínimos, ou seja, R$ 19.080 – calculado pelo valor do mínimo em 2018, de R$ 954. Essa faixa de renda engloba ainda Jardim Botânico, Lago Norte, Lago Sul, Park Way e Sudoeste/Octogonal.

De acordo com a calculadora tributária, quem recebe essa quantia contribuiu com 25% de renda em impostos. Com esse valor, seria possível financiar 14 estudantes da educação fundamental; 14 pessoas atendidas na saúde pública; 750 metros quadrados de vias pavimentadas; 916 quilos de lixo coletados e 2,4 mil pontos de iluminação pública.

Na maior parte das outras regiões administrativas do DF, os moradores recebem entre dois e cinco salários mínimos – de R$ 1.908 a R$ 4.770. É o caso de quem vive em regiões como Varjão, Brazlândia, Planaltina, Paranoá e Recanto das Emas.

Para o menor valor, de dois salários mínimos, o pagamento de impostos subtrai 19% do rendimento mensal. Já para a outra parcela, que recebe cinco salários mínimos, a contribuição é de 23% da renda em tributos.

R$ 115 a menos no orçamento

A Pnad Contínua, divulgada pelo IBGE em outubro deste ano, trouxe um dado alarmante: quase 104 milhões de brasileiros vivem com apenas R$ 413 mensais, considerando todas as suas fontes de renda. Para essa parte da população, a calculadora tributária aponta que 28% dos rendimentos é destinado ao pagamento de impostos. São cerca de R$ 115 a menos no orçamento.

Do outro lado, entre a parcela 1% mais rica da população, o pagamento de impostos representa 25% da renda mensal. Isso significa que dos R$ 16.297 recebidos no mês, R$ 4.074 são destinados a tributos. O orçamento final para o mês seria de R$ 12,2 mil.

Mesmo com os descontos, a quantia mensal do 1% mais rico da população — 2,1 milhões de pessoas — é 29 vezes maior que o recebido integralmente por mês pela metade mais pobre dos brasileiros.

De acordo com Grazille David, a diferença no índice se dá, principalmente, pelos diferentes impostos pagos pelas duas parcelas da população. “Os mais ricos pagam menos [tributos], porque eles não recebem renda de trabalho. Normalmente, eles recebem por juros e dividendos que, desde 1995 no Brasil, não tem taxação de Imposto de Renda.”

Neste ano, até esta segunda-feira (11/11/2019), o brasileiro já pagou mais de R$ 2,13 trilhões em impostos, de acordo com o cálculo do Impostômetro, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

Só no DF, para o mesmo período, a quantia é de R$ 151,7 bilhões. A capital representa 6,67% do total da arrecadação no Brasil. De acordo com a ferramenta, nos últimos três anos, era preciso trabalhar 153 dias para o pagamento dos tributos. No primeiro ano de cálculo, em 2010, eram precisos 148 dias.

Veja quanto é pago de imposto por rendimento:

  • Menos de 1 salário mínimo (abaixo de R$ 998*): 28%
  • Até 1 salário mínimo (limite de R$ 998): até 18%;
  • Mais de 1 a 2 salários mínimos (acima de R$ 998 a R$ 1.996): entre 18% e 19%;
  • Mais de 5 a 10 salários mínimos (acima de R$ 4.990 a R$ 9.980): entre 23% e 25%;
  • Mais de 10 a 20 salários mínimos (acima de R$ 9.980 a R$ 19.960): 25%;
  • Mais de 20 salários mínimos (acima de R$ 19.960): a partir de 25%;
  • Mais de 48 salários mínimos (acima de R$ 47.904): 7%.

* Calculado pelo valor do salário mínimo deste ano

Conscientização

O professor da Universidade de Brasília (UnB) Jorge Fernando Paiva Valente de Pinho aponta que o Brasil tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, o que não reflete no serviço oferecido pelo governo à população. “Oferece serviço de Bangladesh com cobrança de Suécia”, afirma o especialista.

Para ele, o cenário compromete principalmente aqueles que recebem menos. “O percentual que eu pago é o mesmo de quem recebe um salário mínimo, o que não seria aceitável. Vai fazer mais falta para ele”, declarou, citando o pagamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Pinho afirma que a falta de informação contribui para essa realidade. “Se as pessoas fossem bem informadas, não estava do jeito que está. Você sabe quanto de imposto paga em um quilo de arroz?”, questiona. Os criadores da calculadora também acreditam no papel da conscientização em relação ao sistema tributário brasileiro para melhorar a vida dos brasileiros.

“A população sente o peso, mas não entende como cada faixa de renda contribui com o sistema tributário. Muitas vezes, as pessoas mais pobres acham que não estão contribuindo, enquanto a classe média e os mais ricos costumam a falar que fazem uma grande contribuição tributária”, afirma a assessora da Oxfam Brasil Grazielle David.

Segundo ela, a campanha criada pela ONG é importante, pois “mostra que todos nós pagamos impostos e que proporcionalmente, hoje, na verdade, quem acha que não está contribuindo é quem mais contribui”.

A Oxfam Brasil acredita que o conhecimento sobre o assunto pela população será importante para a discussão da reforma tributária. O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou, no último dia 7, que a proposta do governo de reformulação do sistema tributário nacional está quase pronta para ser enviada ao Congresso.

Os pontos principais devem incluir a união de vários tributos que existem hoje em um único e o fim das deduções do imposto de renda para poder baixar a alíquota mais alta de 27,5% para 22%.

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