metropoles.com

Cenas da Copa: a festa das excelências em Doha

Deputados viajam para ver a Seleção e, mesmo a 12 mil quilômetros de Brasília, registram presença no sistema da Câmara

atualizado

Compartilhar notícia

Reprodução
Os deputados José Rocha e Paulo Azi na Copa do Mundo, em Doha
1 de 1 Os deputados José Rocha e Paulo Azi na Copa do Mundo, em Doha - Foto: Reprodução

DOHA e BRASÍLIA – A Copa do Mundo é uma festa e, como acontece sempre com as melhores festas, as excelências de Brasília não poderiam ficar de fora – deixando o interesse público de lado, para variar.

Doutor Luizinho, nome de guerra do deputado federal do Rio de Janeiro Luiz Antonio de Souza Teixeira Júnior, não deixou a oportunidade passar.

Ontem, ele flanava alegremente por Dubai. Sim, Dubai. Como era um dia sem jogos na Copa, o deputado aproveitou que estava perto – cerca de 600 quilômetros separam Doha da futurística cidade dos Emirados Árabes Unidos – e foi até lá dar um passeio. Uma esticadinha básica. Ele voltará para o Catar a tempo de ver a partida das quartas de final, na sexta.

Filiado ao PP, Doutor Luizinho chegou a Doha no último fim de semana. Foi com o filho e dois sobrinhos. Ele jura que viajou por conta própria, sem gastar um tostão de dinheiro público, mas escapole ao explicar por que deixou o Congresso em pleno período de trabalho. “Faz parte da vida”, diz.

Na capital do Catar, o deputado escolheu ficar no luxuoso Hilton The Pearl, um cinco estrelas encravado numa das áreas mais concorridas e caras da cidade, a “Pérola”, onde se concentram lojas de alto luxo e restaurantes estrelados. Durante a Copa, o hotel está abrigando torcedores abonados, familiares de jogadores e convidados da Fifa. Nesta quarta, uma única diária em uma das raras suítes disponíveis ali para reserva saía por pouco mais de R$ 10 mil.

O deputado Doutor Luizinho no estádio 974 na segunda: em Doha, mas registrando presença em Brasília
O deputado Doutor Luizinho no estádio 974 na segunda: em Doha, mas registrando presença em Brasília

Luizinho comunicou à Câmara que estaria fora do país de 3 a 12 deste mês. Só que, na última segunda-feira, dia 5, quando já estava no Catar para ver a Copa de perto, ele misteriosamente registrou presença no sistema eletrônico da casa – um evidente absurdo.

A explicação? “Como deram pra gente a possibilidade de trabalhar à distância às segundas e sextas-feiras, eu trabalhei à distância”, defende-se o deputado, indagado sobre sua “presença-fantasma” no Congresso mesmo estando a quase 12 mil quilômetros de Brasília. Ele afirma que fez o registro “a pedido da presidência” da Câmara.

Enquanto o sistema registrava Luizinho presente, ele assistia da arquibancada do estádio 974 à partida em que o Brasil derrotou a Coréia do Sul por 4 a 1. O deputado é vice-líder do PP, um dos pilares do Centrão e da base do governo de Jair Bolsonaro. Em 2021, ele chegou a ser cotado para assumir o Ministério da Saúde no lugar do notório general Eduardo Pazuello.

“Viajei bancado com meus recursos, sem qualquer convite oficial. Qualquer ser humano que tenha uma necessidade e julgue importante parar seu trabalho para fazer um evento com a sua família, pagando seus próprios custos, acho que é importante. Infelizmente, trabalhamos numa profissão em que a gente não tem possibilidade de negociar as nossas férias. (…) Se eu estivesse na minha clínica, como médico, eu iria parar de qualquer maneira”, disse o deputado.

Ausente, mas presente

Outro deputado que, assim como Luizinho, marcou presença no sistema da Câmara, mas estava no Catar é o baiano José Rocha, do União Brasil. Rocha, aliás, praticamente tirou férias para acompanhar a Copa. Pouco antes de desembarcar em Doha, ele viajou para a COP-27, em Sharm El-Sheik, no Egito.

A viagem para a Conferência do Clima da ONU foi praticamente emendada com a temporada no vizinho Catar. Foi só acabar o evento no Egito, do qual participou à custa da Câmara, que o deputado comunicou à casa que ficaria mais 30 dias fora do Brasil: de 20 de novembro, dia do início do torneio, até 20 de dezembro, dois dias após a grande final.

Assim como o colega, Rocha está bem instalado em Doha, em um confortável hotel da rede internacional Marriott. O deputado, que já foi cartola do Vitória da Bahia, está acompanhado da mulher. Ele disse à coluna que paga a viagem com dinheiro do seu próprio bolso: “Foi particular, ônus pessoal. Estou aqui com meu recurso pessoal”.

Indagado sobre o motivo de ter registrado presença no sistema da Câmara em 5 de dezembro, quando já estava fora de Brasília, ele não respondeu. Tampouco falou sobre passar tanto tempo, um mês inteiro, longe do trabalho.

José Rocha foi vice-líder do governo Bolsonaro na Câmara de maio de 2019 a julho de 2020. Hoje, é vice-líder do União Brasil. Recém-eleito para seu oitavo mandato consecutivo, integra a Comissão de Esporte da Câmara. Há quatro meses, ele virou notícia ao propor a criação de um grupo de trabalho para acompanhar a preparação da Seleção para a Copa. Na ocasião, garantiu que a ideia não era um atalho para ver os jogos por conta dos cofres públicos. “Não queremos viajar”, afirmou.

0

Mais um casal-torcedor

O deputado federal Paulo Azi, mais um do União Brasil da Bahia, chegou ao Catar a tempo de ver o jogo de estreia do Brasil, contra a Sérvia, em 24 de novembro. Assim como o conterrâneo José Rocha, viajou acompanhado da mulher.

No estádio Lusail, os dois deputados viram a partida na companhia de Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil de Bolsonaro, e do vice-presidente do União Brasil, Antonio Rueda.

À diferença dos dois colegas, Paulo Azi não registrou presença na Câmara no período de ausência.

Procurado pela coluna, o deputado não respondeu às tentativas de contato. Na tarde desta quarta-feira, não havia ninguém em seu gabinete.

Registro irregular

A lista de deputados federais que viajaram ao Catar durante a Copa vai mais além. Estão nela o presidente da Câmara, Arthur Lira, do PP de Alagoas, e Eduardo Bolsonaro, do PL de São Paulo, que estiveram no país ainda durante a fase de grupos da competição.

A coluna perguntou oficialmente à Câmara se parlamentares em viagem ao exterior podem registrar presença, como fizeram Doutor Luizinho e José Rocha. A resposta foi que o registro é permitido apenas para parlamentares em missão oficial. A dupla, portanto, não poderia ter feito o que fez. Mas esse, provavelmente, será apenas mais um deslize que passará batido na farra permanente em que vive o poder de Brasília, com ou sem Copa do Mundo.

Compartilhar notícia

Todos os direitos reservados

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comRodrigo Rangel

Você quer ficar por dentro da coluna Rodrigo Rangel e receber notificações em tempo real?