Presidente da Adaps, responsável pelo Programa Médicos pelo Brasil, contratou empresa em que mãe trabalha

A Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde é alvo de investigação de comissão formada pelo Ministério da Saúde, AGU e CGU

Isadora Teixeira
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O diretor-presidente da Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Adaps), Alexandre Pozza Urnau Silva, é investigado por contratar uma empresa na qual a mãe trabalha. Vinculada ao governo federal, a Adaps foi criada em 2020 para gerir o Programa Mais Médicos, que mudou de nome, à época, para Programa Médicos pelo Brasil.

Uma comissão foi criada, em fevereiro de 2023, para investigar denúncias de irregularidades na Adaps, formada por integrantes do Ministério da Saúde, Controladoria-Geral da União (CGU) e Advocacia-Geral da União (AGU).

O relatório preliminar, expedido na última segunda-feira (20/3), aponta que o diretor-presidente da agência foi o responsável por contratar, sem licitação, o Instituto Euvaldo Lodi do Distrito Federal (IEL-DF) para realizar processos seletivos para ocupação de cargos e função na agência. Em reunião nesta sexta-feira (24/3), a diretoria da Adaps foi afastada em função das supostas irregularidades.

O IEL-DF foi contratado pela Adaps em 2021, com valor previsto de R$ 218 mil. A mãe do diretor-presidente da Adaps, Ana Helena Pozza Urnal Silva, é empregada do IEL-DF desde 2017.

Veja figura incluída no relatório preliminar sobre a relação familiar:

Figura mostra relação entre diretor-presidente da Adaps e funcionária de empresa contratada, que é mãe dele

Uma resolução interna da Adaps proíbe, expressamente, a contratação de empresas que empreguem familiares de funcionários da Adaps que exerçam cargo de direção na agência ou cuja atribuições estejam relacionadas à área responsável pela contratação.

Segundo a comissão de investigação, Alexandre Pozza, enquanto diretor-presidente da Adaps, participou diretamente de todo o processo de contratação.

“É preciso considerar, ainda, que o conflito de interesse se ressalta pelo fato de o Sr. Alexandre Pozza, diretor-presidente da Adaps, ter poder de decisão suficiente para decidir pela contratação por dispensa de licitação da entidade cujo corpo funcional sua mãe integra”, diz trecho do relatório preliminar.

A comissão analisa outras denúncias envolvendo a Adaps, incluindo contratação de casais. No relatório preliminar, o colegiado apontou “forte dificuldade de obtenção de informações” e decidiu prorrogar os trabalhos até 5 de abril.

O outro lado

A coluna acionou a Adaps, que emitiu parecer somente após a publicação desta reportagem. Em nota, a entidade confirmou que o Conselho Deliberativo da Adaps decidiu pelo afastamento cautelar da atual diretoria do órgão.

“A medida foi adotada diante de irregularidades na esfera administrativa e correicional apontadas em relatório preliminar da comissão criada pelo Ministério da Saúde, com participação da CGU e AGU, para avaliação dos atos da Adaps após denúncias recebidas oficialmente. Para a elaboração do relatório foram analisados contratos, termos de cessão, acordo de parceria, ordem de serviço e fornecimento de bens, entre outros atos da Adaps. Foram encontrados indícios de irregularidades apontados no relatório preliminar”, disse o posicionamento da associação.

A reportagem não conseguiu contato direto com os citados.

Também por meio de nota, o IEL-DF afirmou que respondeu às informações solicitadas pela Adaps e disse que a contratação “ocorreu seguindo parâmetros legais”.

Confira a nota do IEL-DF:

“O Instituto Euvaldo Lodi do Distrito Federal (IEL-DF) recebeu da Diretoria de Gestão Administrativa da Agência de Desenvolvimento de Atenção Primária a Saúde (ADAPS) requerimento de informações complementares por meio da Comissão de Acompanhamento, Avaliação e Supervisão dos Atos de Gestão Administrativa dos Atos Finalísticos.

Tal requerimento foi respondido por completo e encaminhado à diretoria da ADAPS nesta sexta-feira, 24 de março de 2023.

A contratação do IEL-DF para realização de processos seletivos ocorreu seguindo parâmetros legais, de acordo com o artigo 22 da Resolução nº 3, de 15 de outubro de 2021, que rege, entre outros pontos, as contratações feitas pela ADAPS.

Sobre a profissional do IEL-DF citada, a instituição esclarece que ela é empregada desde 2017, exercendo função de consultora como horista. A profissional nunca exerceu cargos de gestão no IEL-DF e nunca atuou no setor de processos seletivos, portanto, não exerce influência sobre contratações do Instituto, tampouco participa de qualquer processo seletivo realizado pelo IEL-DF.

É importante esclarecer que, diante das condições contratuais, não houve repasse financeiro da ADAPS para o IEL-DF, tendo o Instituto sido remunerado pelas inscrições realizadas por candidatos.

Todos os processos seletivos realizados para a ADAPS foram feitos de forma transparente. As informações sobre cada processo estão disponíveis com todo o encaminhamento das vagas no site do IEL-DF.”

Confira a nota, na íntegra, da Adaps:

Em assembleia extraordinária realizada nesta sexta-feira (24/03), o Conselho Deliberativo da Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária (ADAPS) decidiu pelo afastamento cautelar da atual diretoria do órgão.

A medida foi adotada diante de irregularidades na esfera administrativa e correicional apontadas em relatório preliminar da comissão criada pelo Ministério da Saúde, com participação da CGU e AGU, para avaliação dos atos da ADAPS após denúncias recebidas oficialmente.

Para a elaboração do relatório foram analisados contratos, termos de cessão, acordo de parceria, ordem de serviço e fornecimento de bens, entre outros atos da ADAPS.

Foram encontrados indícios de irregularidades apontados no relatório preliminar, entre os quais:
• Indícios de conflito de interesse na contratação do IEL-DF para realização de processos seletivos para a composição da equipe da ADAPS;
• Indícios de vícios e inconformidades nos processos seletivos para o corpo técnico-administrativo da ADAPS;
• Risco de troca de influências entre o Setor Jurídico da ADAPS e o Ministério combinado com risco de influência na definição dos atos finalísticos da ADAPS;
• Dificuldade de obtenção de informação.

Diante disso, o Conselho Deliberativo da ADAPS resolveu:
1. Constituir diretoria interina a partir desta data;
2. Afastar a atual diretoria, garantindo o direito de ampla defesa;
3. Instituir comissão interna para investigação dos fatos citados.

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