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Feira Motim traz três dias de quadrinhos e publicações independentes

Evento ocupa a Biblioteca Nacional e abre espaço para encontro de autores, editoras e amantes das HQs

atualizado

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Para o teórico político Mikhail Bakunin, fundador das correntes anarquistas da sociologia, o motim é um ato consciente da classe trabalhadora, claramente direcionado a um fim. Este ato voluntário e consciente politicamente é a inspiração para a quarta edição do mercado de produção independente que leva como nome justamente esta incitação organizada à revolta (MOTIM).

O sentido simbólico e a virulência deste ato estão presentes nas intenções dos eventos da feira. A ideia é tomar partido desta intensa produção gráfica do Distrito Federal e de outros estados e afirmar uma ordem diferente do mercado das grandes editoras e do mainstream imbecilizante. É hora de se amotinar!


Neste quarto ano de existência, o Motim cresceu e terá três dias repletos de eventos criteriosamente bem pensados para o público amante dos quadrinhos e das artes gráficas. A base será a Biblioteca Nacional e verá, no dia 17, a abertura da exposição “Pela Moral e os Bons Costumes”, sarcástica porrada na cara de certa ideologia tosca que vemos dominar os noticiários e a internet todos os dias.

Artistas de primeiro escalão das HQs nacionais (ainda que não estejam presentes), como Allan Sieber, Cynthia Bonacossa e Pablo Carranza, vão expor visões contraventoras em serigrafias que poderão ser adquiridas no local. No mesmo dia chega a Brasília ainda o lançamento da obra mais ambiciosa (e maneira!) de sua prata da casa, o idiossincrático Gabriel Góes: “Soco! Volume 1“.

Expositor Lote 42, de São Paulo

 

Nos dias 18 e 19 ocorre a feira efetivamente e teremos um grupo grande de amotinados dos quadrinhos underground: feios, sujos e malvados? Bem… haverá de tudo. Um dos principais destaques é a presença da trupe da Beleléu, já tradicional selo carioca de quadrinhos espertos e autorais. Eles estarão lançando a aguardada nova publicação de Elcerdo (“Cadê seu Zine?”), nome destacado da cena do Rio.

Outras marcas interessantes, como Lote 42 (SP), A Bolha (agora no DF) e Nega Lilu (GO), vão compor o mapa do Motim com mais de cem outros selos. Além de quadrinhos, o visitante vai conferir trabalhos de excelência em impressão, zines, pôsteres e até discos de vinil.

O lançamento de “Soco! Volume 1”, a HQ de Góes, será um dos pontos altos porque é o trabalho mais autoral e afetivo deste artista. Psicodélico, o livro enfoca, em vários modelos e linguagens de quadrinhos, o cândido herói Billy Soco, que é pura influência do mangá clássico de Tezuka misturada aos delírios da mente de Góes. É um exemplo sobre como podem convergir os universos dos quadrinhos, da publicidade, da memorabilia e do design.


O fato de “Soco” ser o trabalho mais radical e ao mesmo tempo cerebral de Góes se alinha com a ideia bakuniniana de que o motim existe como incitação organizada à revolta. É a isso que o evento se propõe: se libertar de amarras estéticas e mercadológicas na forma de coletivos bem engendrados.

Seguem duas perguntas para Góes e Elcerdo por parte da ZIP:

 Gabriel Góes (“Soco! Volume 1”)

O quadrinho tem um pouco de tudo: colecionáveis, estética de propaganda antiga, design de bonecos, vários tipos de quadrinhos, etc. Como você criou o personagem e elaborou todas estas plataformas para representá-lo?

Góes: Originalmente o Billy Soco era um comentário sobre o mangá e anime e, como em alguns casos, essas histórias demoram para se desenvolver, por exemplo dez episódios para o vilão juntar 100% de seu poder.

Com o tempo “Soco!™” foi encorpando, percebi que poderia contar qualquer tipo de história com os personagens, mas que isso demoraria. Os brinquedos e produtos são uma forma de expandir o universo sem que eu tenha que me esforçar muito, o leitor preenche as lacunas.

Além disso é muito divertido inventar produtos esdrúxulos com a cara do personagem estampada, e também um jeito de eu me manter interessado na continuidade da franquia sem enjoar.

Seus quadrinhos têm uma pegada punk misturada a este apelo de produtos mais comerciais. Como você coordena estas influências para produzi-los do jeito que mais gosta?

Góes: Eu vivo um conflito de interesses: ao mesmo tempo que amo os heróis e comics, eu tenho vontade de destruí-los e ridicularizá-los. Com o tempo desenvolvi dois estilos, um limpo e bem acabado e o outro feio e sujo. Acho que é mais ou menos assim que coordeno minhas influências, um para exorcizar o outro. Mas confesso que me divirto mais com meu desenho “porco”.

Tiago Elcerdo (“Cadê seu Zine?”)

O nome do seu zine (“Cadê seu Zine?”) é uma ironia com a sua “demora” para um novo lançamento. Como você vê a relação do quadrinista, uma profissão difícil e mal remunerada, com a realidade pessoal e profissional que o cerca?

Elcerdo: Eu venho buscando um ritmo de produção que se adeque ao momento de minha vida. Falo em relação ao traço e à narrativa. Tem sido difícil para mim encaixar umas horas no dia a dia para a produção autoral. Admiro o pessoal que consegue este ritmo de produção diário e ainda receber por isto.

A produção de um quadrinho para mim requer dedicação e imersão. Eu não consigo simplesmente tirar uma hora do meu dia e fazer quadrinho. Mas talvez seja o caminho e precise buscar como.
Este meu zine “Cadê Seu Zine?” era uma série que eu postava nas redes sociais como um exercício de criatividade.

Gosto de pensar nestas temáticas e achar um ponto de partida que me leve à produção em série. Tanto em meu trabalho pessoal como na editora Beleléu é comum estas brincadeiras que acabam levando a uma série ou publicação. O zine foi impresso na loucura, usei como um incentivo para me animar a produzir algo novo logo, e sair deste limbo.

Recentemente você se pronunciou nas redes sociais sobre certa polêmica a respeito da cobertura midiática dos eventos “independentes” de HQ. Como você acha que a comunidade dos quadrinhos deve fazer para integrar melhor produção e recepção?

Elcerdo: Legal você falar sobre isto, porque achei super pertinente o que o Gabriel Bá escreveu. Não vou entrar em detalhes do tom que ele escreveu ou das palavras que usou. Muita gente levou pro lado pessoal ou por birrinha, e talvez inveja, atacaram o cara. Talvez tenham feito uma leitura errada da postagem dele, e acredito que em muitos casos a carapuça serviu.

O que ele escreveu foi um fato. Estas feiras de publicações ainda são menosprezadas por nossos “jornalistas especializados”. Atualmente estas feiras se tornaram a maior força para a produção independente, até mesmo para as pequenas editoras. Elas se espalharam pelo Brasil todo e se transformaram num importante meio de divulgação de trabalho e de venda.

Acho que os quadrinistas ainda não sabem o papel dos jornalistas de quadrinhos. Eles não trabalham para os quadrinistas, todos trabalham juntos. Ambos se ajudam, o trabalho deles não é fazer propaganda dos livros.

As redes sociais acabam gerando certos vícios. Ultimamente só tenho visto estas “resenhas” nos canais de youtubers, e acabam me parecendo meio falsas, tipo mídias pagas. Parece que tudo funciona num esquema de camaradagem por postagem paga.

Ai fica difícil de acreditar no que estão falando. Fica parecendo que todo livro que chega a eles é uma excelente recomendação. É difícil dizer como deve ser esta integração, leva tempo. Mas é preciso entender que temos jornalistas sérios, que se dedicam e estão atrás da informação, estão acompanhando esta cena atual.

Alguns já se ligaram da importância destas feiras. Sabem que ali tem muita gente boa começando e até uma galera com alguns anos de estrada. E temos também aqueles fãs de quadrinhos que apenas acham que são jornalistas, focam apenas no mainstream.

Estão preocupados apenas com grandes eventos e publicações já conhecidas ou de nome. Não critico porque este pessoal alimenta um outro tipo de produção também. Acho necessário para fortalecer o mercado e termos quadrinhos para todo público. Mas não me venha dizer que é jornalista.

SERVIÇO
Motim – Mercado de Produção Independente
Dia 17 de novembro, a partir das 19h; Nos dias 18 e 19 de novembro, a partir das 10h.
Entrada gratuita.
Será no Território Criativo (anexo térreo da Biblioteca Nacional de Brasília)
Classificação indicativa: 16 anos

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