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Dá medo ver o monstro da intolerância crescer a cada dia

Exposições censuradas, LGBTIs apanhando nas ruas e gritos raivosos são sintomas de uma força fora de controle

atualizado

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close up portrait of a man shouting, mouth wide open
1 de 1 close up portrait of a man shouting, mouth wide open - Foto: iStock

“Esse silêncio todo me atordoa/Atordoado eu permaneço atento/Na arquibancada para a qualquer momento/Ver emergir o monstro da lagoa”. Chico Buarque escreveu isso há mais de 40 anos e é a melhor definição de como me sinto atualmente: na arquibancada, vendo o monstro prestes a emergir. E pior, eu sei que ele vem!

Não paro de pensar nos versos acima. Para piorar, tudo confirma essa sensação. É a tirinha do Laerte; são as notícias nos jornais; a capa da Veja; o Fefito que usa a camisa JE SUIS GAY (eu sou gay, em francês) e é ameaçado de morte porque a pessoa leu “Jesus é gay”; a conversa despretensiosa e desbocada nos lugares públicos e no sacrossanto espaço do lar.

O silêncio está deixando todos atordoados, mas as ruas gritam. A quietude é justamente das instituições, das esferas de poder. A mudez de quem planeja o soco, o golpe e assim nos deixam atordoados.

O golpe vem no debate sobre o Queermuseu, o MAM de São Paulo e ganha força na proibição sumária do teatro no Castelinho do Flamengo. Não são apenas questões de ideias e opiniões, porque  tudo isso chega até a pancada certeira e fatal (literalmente) nas travestis, nos  trans, nas lésbicas e gays. Nas mães, pais e filhos confundidos com casais gays.

E que dor de ver gente aplaudindo a cabeça do monstro que já aponta lá na superfície da lagoa. Por que tanto medo da liberdade? Por que esse pavor de decidir a própria vida? Escolher os próprios governantes? De fiscalizar se o dinheiro público é empregado de forma correta? Por que temer um corpo nu?

Por que ter medo que as pessoas amem a quem lhe aprouver?

As posturas políticas governamentais têm consequências nas atitudes do indivíduo. As pessoas apoiam a violência porque acreditam cegamente que esse ódio não vai se voltar contra elas. Não é bem assim. Metaforicamente, nesse caso, sua própria arma pode acabar atirando em você.

Eles aguardam, extasiados, a emersão do monstro do fundo da lagoa e têm esperança que ele pegue o outro que está sentado ao seu lado na arquibancada. Já eu sei que o monstro vem atrás de mim. De nós.

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