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Ninguém está seguro nas redes sociais. E não estamos nos preocupando

Não há liberdade dentro desse esquema de controle e vigilância. E não haverá democracia enquanto isso não for regulado

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Gui Prímola/Metrópoles
Ilustração para coluna do Anderson França sobre redes sociais
1 de 1 Ilustração para coluna do Anderson França sobre redes sociais - Foto: Gui Prímola/Metrópoles

Ninguém está seguro nas redes sociais. E não estamos nos preocupando com isso.

Não tem mais como fugir.
No momento em que você pousa o celular na mesa e come teu sanduíche, ele começa a te ouvir. Aparelhos smartphones ouvem tudo em volta deles num raio de dois metros de distância. Quanto melhor o microfone, melhor o “ouvido” do aparelho.

Já digo isso desde 2017.
Quando escrevi uma crônica dizendo que um dia queria morar numa beira de praia e ter uma caminhonete pra buscar comida na cidade, eu estava saboreando um misto quente carregado na manteiga, crocante por fora, macio por dentro, queijo derretendo, Satanás operando, e falando com a minha companheira sobre esse sonho.

Terminamos de comer e abri o Facebook.
Propagandas de agência de viagens para praias no Nordeste, propagandas de casas pré-fabricadas, propagandas de caminhonetes 4×4.

Naquele 2017, isso foi lido por mais de 100 mil pessoas, e muitas duvidaram.
Se passaram apenas três anos.

E nós, mortais, sabemos que a Samsung, Google, Facebook, Instagram, os celulares, tablets, aparelhos de TV e mesmo os laptops nos ouvem, nos FILMAM, acessam nossa tela pra saber onde clicamos, onde passamos mais tempo, para que lugar na tela olhamos mais, que tipo de imagem gostamos, que tipo de palavra escrevemos, tudo.

“Histórico de navegação” é uma criança na frente desse monstro criado pelas grandes empresas de tecnologia, que sabem tudo sobre você, não apenas o que você digita, mas o que você FALA QUANDO ESTÁ SOZINHO EM CASA.

Ou que tipo de foto gosta mais. E na foto que gosta, o que exatamente gosta na foto.
Os teus OLHOS são monitorados.

O algoritmo é apenas uma das ferramentas, com uma função específica. Essas, mais invasivas, são de responsabilidade partilhada: quem cria o software, quem gere a internet, quem fabrica o celular, a rede social. Várias empresas gigantes operando num único sentido: saber quem é você, e vender desde pulseira de relógio a candidato presidencial.

E vocês sabem, isso não acaba bem.

Muita informação na mão de conglomerados, que, além de monetizar, estão devassando a sua vida inteira. Não existe isso de privacidade. Se você tem conversa íntima com alguém no WhatsApp, pelo menos um departamento inteiro num andar de um megaedifício em São Paulo está lendo e OUVINDO tudo.

O Google não apenas ouve, ele GRAVA.
E por mais que exista uma opção de não acessar a câmera e o microfone do seu celular, quem vigia isso? Você? Quem pode garantir que eles não escutam tudo? Que organismo de regulação há?

Social Dilema e Privacidade Hackeada são documentários que surgiram novamente esses dias nas redes sociais. A conclusão que todos chegam é de que não há futuro sem a mudança da internet. Sem que empresas como Facebook sejam muito controladas, pelo bem público.

Nós precisamos da internet, a pandemia prova isso. Trabalhamos on-line, recebemos o salário on-line, pagamos conta on-line, estudamos, fazemos terapia, política, arte, tudo on-line. Mas não pode ter um custo tão alto.

Porque já dizem em Silicon Valley: “Se parece que você está usando esse aplicativo de graça, é porque é você quem está pagando”.

E não se trata apenas de uma invasão de privacidade, mas de despertar de doenças mentais. Carências, egos, autoritarismos e terrorismo digital, como a extrema-direita faz. Aí, pra derrubar uma democracia, bastam duas ou três pessoas, um celular e um 4G. Numa sala. Como um gabinete do ódio.

Que o Carlos Bolsonaro assume que usou robôs. E pouco se lixa.

Estamos debaixo dos olhos de alguns.
Não há liberdade, dentro desse esquema de controle e vigilância.
E não haverá democracia, enquanto isso não for regulado.

* Este texto representa as opiniões e ideias do autor.

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