Yanomamis relatam mortes desde 2017 em aldeia assediada pelo garimpo

Investigação dos indígenas sobre fuga de membros da comunidade Aracaça revela histórico de violência. Eles pedem a expulsão dos garimpeiros

Raphael Veleda
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A mobilização em torno da denúncia sobre a morte de uma adolescente Yanomami motivou as lideranças da região a reforçarem os pedidos de socorro, e lembrarem que há, desde 2020, uma decisão judicial determinando que o governo federal retire os garimpeiros que operam ilegalmente na reserva, em Roraima.

Os Yanomamis vivem na maior terra indígena do Brasil, com quase 10 milhões de hectares, e formam uma comunidade de quase 30 mil pessoas. As informações mais recentes indicam que quase o mesmo número de garimpeiros trabalha dentro da reserva, o que é proibido. A expulsão deles foi determinada pelo Tribunal Regional da 1ª Região e o governo federal realiza ações de repressão, inclusive com a destruição de maquinário, mas o problema segue longe de ser resolvido, segundo as lideranças locais.

A Hutukara Associação Yanomami, entidade mais representativa na reserva, divulgou carta nesta sexta-feira (6/5) relatando um longo histórico de violência imposta por garimpeiros na região da aldeia de Aracaça, onde houve a denúncia de que uma adolescente de 12 anos teria sido estuprada e morta e que uma criança teria caído no rio e desaparecido na última semana.

Também nesta sexta, a Polícia Federal divulgou conclusões prévias de sua investigação e alegou que são falsas as informações sobre o estupro e morte e que o relato teria tido origem em um mal-entendido.

Os Yanomamis não comentaram ainda as conclusões da PF, mas relatam que as denúncias em Aracaça não são um caso isolado. “Em todo o território, o garimpo invade nossas terras, destrói nosso modo de vida, nossas roças e gera fome e violência”, diz a carta, que faz um relato sobre essa violência justamente em Aracaça ao menos desde 2017.

Os indígenas contam ter entrevistado, nos últimos dias, parentes que vivem próximos à região de Aracaça e uma idosa da comunidade que está em Boa Vista e ouvido “reiterados depoimentos de violência sexual em série”.

A investigação indígena cruzou esses relatos com dados sobre óbitos registrados no Distrito de Saúde da região.

Para não expor os indígenas, eles identificaram cada vítima por apenas uma letra e contaram uma trágica história que começou em 2017, com o assassinato, por arma de fogo, do indígena C., que deixou duas esposas, W., e K, “em situação de extrema vulnerabilidade, sendo prostituídas nos acampamentos de garimpo”.

W. teria morrido em seguida, com registro de que teria se auto envenenado, e uma filha de K., na época com 16 anos, teria sido “explorada e prostituída, por vezes sendo obrigada a manter relações sexuais com mais de uma pessoa ao mesmo tempo”.

Essa adolescente teria engravidado duas vezes como resultado dos abusos. Na primeira, ela teria sofrido um aborto e, na segunda, o garimpeiro suposto pai teria lhe roubado a criança e levado para outra cidade, o que teria motivado a jovem a cometer suicídio.

“A sequência de tragédias que marcaram a família de C. demonstra que na aldeia de Aracaça há casos generalizados de abuso e violência”, diz a carta. “As denúncias sobre Aracaça só podem ser compreendidas dentro desse cenário, no qual metade das aldeias da TI Yanomami está sujeita ao assédio de invasores”, completa o texto.

Por fim, os Yanomamis pedem que “se conduza uma apuração mais ampla e aprofundada do histórico de violências vivida pelos indígenas em Aracaça por consequência do garimpo ilegal”.

Para os indígenas, “se a União estivesse cumprindo a ordem judicial do TRF-1, que, desde 2020, determinou a retirada dos garimpeiros ilegais de nossas terras, muitas das tragédias vividas pelos Yanomamis teriam sido evitadas”.

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