“Vão acabar com a carreira diplomática no Brasil”, diz Celso Amorim

Ex-chanceler concedeu entrevista ao Metrópoles e criticou projeto de Davi Alcolumbre (DEM-AP) que incentiva parlamentares no Itamaraty

atualizado 23/10/2021 9:07

Rachel Sheherazade entrevista Celso Amorim Metrópoles

Chanceler brasileiro entre 2003 e 2010, Celso Amorim classificou como “um absurdo total” a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) que desobriga parlamentares da renúncia ao mandato para assumirem postos diplomáticos. “Vão acabar com a carreira diplomática no Brasil”, apontou o ex-ministro.

“Vão distribuir cargos no Itamaraty para conseguir votos. É assim, é da natureza das coisas. Vai contra uma tendência mundial. Se permitir que deputados e senadores possam assumir e depois voltar para o cargo parlamentar, vai entrar nesse mercado geral das emendas, isso é o fim. [Ser diplomata] exige um conhecimento técnico, não é um representante pessoal do presidente”, pontuou (confira a partir de 11’30”).

Amorim comentou a troca no comando do Ministério das Relações Exteriores, em abril, quando Ernesto Araújo deixou o cargo e foi sucedido por Carlos França. Para o ex-chanceler, as mudanças são apenas comportamentais. Apesar de lamentar o episódio no qual o atual ministro ergueu as mãos e simulou uma arma – gesto de campanha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) –, nas imediações do prédio da Organização das Nações Unidas (ONU), Amorim enxergou uma melhora sutil.

“Eu acho que o atual ministro procura se manter numa normalidade, razoabilidade, racionalidade. Agora, a política externa não mudou. É muito difícil querer isso, a política é a do presidente. Nas outras questões acho que ele tem tentado passar do péssimo para o muito ruim. Eu acho que ele tem procurado ser mais discreto, menos espalhafatoso e a gente ganha alguma coisa no estilo. No conteúdo a mudança é mínima, tende a zero”, ponderou (7′).

Militares no governo

Amorim, que esteve à frente do Ministério da Defesa no governo Dilma (PT), criticou o papel assumido pelos militares no atual governo. “Eu não acho que tem de acabar com as Forças Armadas, pelo contrário. Elas têm de ser fortalecidas para cumprir sua missão. Agora, estão tratando de coisas que não lhes dizem respeito. Militar tem que cuidar do quartel, da defesa do país. [Tratam] como se eles fossem cidadãos incorruptíveis. Não são, são cidadãos como outros quaisquer”, afirmou.

Questionado por Sheherazade acerca do isolamento diplomático do país, Amorim, que foi considerado “o melhor chanceler do mundo” por uma revista especializada, mostrou revolta. “Conseguiu o que queria. O Brasil hoje é um país isolado, é uma coisa impressionante. O Brasil é o quinto em território, o sexto em população, historicamente tem sempre estado entre as 10 maiores economias do mundo, um país com uma pujança multirracial, com 10 fronteiras. É uma proeza isolar; conseguiu”, argumentou (15′).

Para a participação na Convenção do Clima, em Glasgow, na Escócia, Amorim disse não ter muitas expectativas. “O ex-ministro do Meio Ambiente está sendo processado por exploração de madeira ilegal. O Brasil vai ter que fazer alguma coisa para não ficar o tempo todo no banco dos réus, mas sem nenhuma expectativa de que isso mude a percepção que se tem no momento”, afirmou.

Celso Amorim também falou de episódios de espionagem de agentes norte-americanos no Brasil durante as gestões petistas e da recente mobilização de parlamentares dos EUA pedindo que o presidente Joe Biden reveja a oferta para que o Brasil se torne um parceiro global da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e revogue a condição de aliado extra-Otan concedida ao país ainda no governo de Donald Trump. Confira:

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