EPL, estatal responsável pelo trem-bala Rio-SP, é alvo de denúncias
Empresa de Planejamento e Logística, criada em 2012 para colocar nos trilhos o primeiro trem de alta velocidade do Brasil, não cumpriu o objetivo. Hoje, se assemelha a outros órgãos da administração pública em quesitos como o loteamento por políticos
atualizado
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Quando foi criada, ainda em 2012, o principal objetivo da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), vinculada ao Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil, era operacionalizar o ambicioso projeto do trem-bala, que ligaria Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas (SP). Além disso, a estatal deveria auxiliar na realização de projetos e concessões de obras de infraestrutura para a iniciativa privada. Mas, passados quatro anos desde sua criação, a EPL segue fora dos trilhos, com as engrenagens enferrujadas por velhas práticas, como loteamento de cargos para apadrinhados do PT e do PR.
Outro problema diz respeito ao exercício irregular de advocacia dentro dos quadros da empresa e envolve a Procuradoria Jurídica-Geral. A titular do cargo, Andrea Andreis, defende o próprio marido, acusado de corrupção. Ex-diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (Dnit), Hideraldo Carón responde a processos na Justiça e no Tribunal de Contas da União (TCU) por superfaturamento em obras rodoviárias no sul do país, entre outras suspeitas. Andrea era a representante jurídica dele nesses processos — prática vedada pela Lei 8.096/94, que impede servidores de advogar contra a fazenda pública que o remunere.Ao ser nomeada para o cargo na EPL, Andrea deveria ter pedido desligamento do caso envolvendo o marido. No entanto, como mostra edição do Diário Oficial da União (DOU) de 4 de abril, ela ainda constava como representante legal de Hideraldo.
“Quando o servidor assume cargo público e possui ação contra a fazenda pública, precisa ter o cuidado de subestabelecer a causa. Isso não pode continuar acontecendo em paralelo à atividade pública que o remunera”, explicou o advogado Antônio Rodrigo Machado, que faz parte da Comissão de Legislação Anticorrupção da Seccional do DF da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF).
Ao ser questionada sobre o episódio, a EPL se limitou a responder, por meio de nota, que “a procuradora-geral Andrea Vieira Andreis constituiu o advogado Pablo Alves Prado como seu procurador no caso”.
Apadrinhados do PT e pressão de deputado federal
Andrea e Hideraldo pertencem ao grupo político do deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), padrinho de uma série de cargos na EPL ao longo dos governos petistas. A relação de Hideraldo com o PT é antiga, tanto que ele foi o representante do governo gaúcho em Brasília durante a administração Tarso Genro (2011-2014). Na época, Hideraldo já respondia a ações na Justiça.
Com o afastamento da agora ex-presidente Dilma Rousseff (PT), técnicos da empresa relataram ao Metrópoles que o deputado Paulo Pimenta vem tentando articular uma maneira de manter a influência dentro da EPL. No entanto, ao ser questionado pela reportagem, o parlamentar negou que tenha qualquer ingerência sobre a estatal. “É uma calúnia dizer que quero ter influência por lá”, protestou. Pimenta ainda refutou a informação de que Andrea seja sua indicação.
Embora negue a proximidade com a procuradora-jurídica-geral da EPL, tanto Andrea quanto o marido, Hideraldo, doaram R$ 5 mil cada um para a campanha de Pimenta em 2014. O deputado assegura que esse fato não tem relação com a indicação de Andrea para o cargo: “Eu não sei o emprego de todo mundo que me faz doação”, rebateu.
A influência do PR
Outro caso controverso na EPL é a suspeita de nomeação envolvendo a esposa de um servidor ligado ao PR que foi alvo da chamada “faxina ética” no primeiro governo de Dilma Rousseff. Alessandra Campos Carvalho de Souza, lotada na Gerência de Finanças da Empresa de Planejamento e Logística, teria sido nomeada após forte pressão do marido, Augusto César Carvalho Barbosa de Souza.
Augusto César, servidor de carreira da Controladoria-Geral da União (CGU), foi coordenador-geral da área de Contas do Governo na pasta. Mas, na gestão petista, passou a atuar na área de Transportes, que era comandada pelo PR. Foi por meio do partido que Augusto César chegou ao Dnit. Em 2006, ele foi nomeado ouvidor do departamento e, a partir de 2008, passou a acumular também o cargo de corregedor da instituição, encarregado de investigar e punir responsáveis por desmandos.
Posteriormente, Augusto César passou a ser investigado pelo próprio órgão de origem, a CGU, por suspeita de envolvimento em irregularidades que derrubaram o então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, e outros seis membros da cúpula da pasta ligados ao PR, ainda em 2011.
Ao ser indicado para assumir a Diretoria de Administração e Finanças do Dnit naquele mesmo ano, foi “desconvidado” por Dilma devido ao histórico suspeito.
Mesmo após o episódio, Augusto César conseguiu um cargo no setor comandado pelo PR. Em junho de 2015, ele foi nomeado assessor especial de controle interno no Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil, onde está até hoje.
Por meio da assessoria de imprensa, a EPL negou irregularidades e informou que os critérios de escolha de Alessandra foram técnicos, e não políticos. “Alessandra Campos Carvalho de Souza é uma profissional qualificada, com ampla experiência na administração pública”, disse, por meio de nota.
Entretanto, o advogado Antônio Rodrigo Machado, da Comissão de Legislação Anticorrupção da OAB-DF, contesta a informação.
Há uma presunção de imoralidade na contratação de parentes para cargos de confiança dentro de órgãos ou esferas públicas vinculadas. Há um impedimento, ainda que eles tenham qualificação técnica
Antônio Rodrigo Machado, da Comissão de Legislação Anticorrupção da OAB-DF
A reportagem não conseguiu contato com Andrea Vieira Andreis, Hideraldo Carón, Augusto César Carvalho Barbosa de Souza e Alessandra Campos Carvalho de Souza para comentar o caso.