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Pressão de Bolsonaro sobre Folha reforça relação difícil com imprensa

Entrevista do presidente eleito ao JN provocou reação de autoridades e jornalistas. Internautas fazem campanha pró-assinaturas do jornal

atualizado

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Reprodução/TV Globo
Bolsonaro JN
1 de 1 Bolsonaro JN - Foto: Reprodução/TV Globo

Na noite de segunda-feira (29/10), em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), revelou como pretende tratar a Folha de S.Paulo depois que tomar posse. “Não quero que (a Folha) acabe. Mas, no que depender de mim, imprensa que se tornar indigna não terá recursos do governo federal. Por si só esse jornal acabou”, declarou o futuro sucessor de Michel Temer.

O periódico paulista entrou no radar de Bolsonaro desde janeiro, quando publicou reportagem sobre moradora do distrito de Mambucaba – próximo a Angra dos Reis (RJ) – Walderice Santos da Conceição. Contratada pelo gabinete de deputado do futuro presidente com um salário de R$ 1.351,46, ela morava no povoado e dava expediente vendendo açaí na praia.

De acordo com o jornal, Walderice também cuidava de uma casa que Bolsonaro possui em Mambucaba. O parlamentar negou irregularidade na contratação e alegou que o trabalho dela era “reportar” ao gabinete “qualquer problema na região”.

A Folha voltou a incomodar Bolsonaro na reta final da campanha ao Planalto, com reportagem sobre a compra, por empresários, de pacotes de disparos de WhatsApp com mensagens contra adversários do então presidenciável. A prática, negada por ele, configura crime de caixa 2, visto que empresas não podem mais doar ou injetar recursos em campanhas eleitorais.

Por causa das reportagens, o deputado do PSL entrou com três ações contra o jornal. Neste contexto, as declarações do presidente eleito no Jornal Nacional soaram como ameaça contra a Folha de S.Paulo. Em consequência, leitores, jornalistas e autoridades desencadearam na Internet uma campanha em defesa do periódico e da liberdade de imprensa. Muitos anunciaram a intenção de fazer assinatura do veículo, em apoio à pressão sofrida.


“A imprensa livre é fundamento da Democracia. A Folha de S.Paulo é patrimônio dos brasileiros que cultuam a inteligência e os direitos da cidadania”, tuitou o jornalista Chico Pinheiro, apresentador do Bom Dia, Brasil, da TV Globo.

Adversário de Bolsonaro no primeiro turno da eleição presidencial, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) também usou o Twitter para se posicionar favoravelmente ao periódico. “Os ataques feitos pelo futuro presidente à Folha de São Paulo representam um acinte a toda a imprensa e a ameaça de cooptar veículos de comunicação pela oferta de dinheiro é uma ofensa à moralidade e ao jornalismo nacional”, escreveu o tucano.

Ex-prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes (DEM) também usou o Twitter para apoiar o jornal. “Acabei de renovar a assinatura da @folha”, escreveu o democrata. Em tom bem-humorado, ele fez referência a Cátia Seabra, uma das mais conhecidas e implacáveis repórteres do diário paulista. “E adoro que a @Catia_Seabra esteja em São Paulo. Mas se voltar para o Rio para ficar no meu pé, continuarei assinando. São necessários!”, acrescentou Paes.

Reação em cadeia
A entrevista no Jornal Nacional despertou a atenção também na área acadêmica. Procurado pelo Metrópoles, o jornalista e professor Eugênio Bucci, primeiro, ressalvou que Bolsonaro ainda não tomou posse. “Ele ainda fala como um candidato em clima de comemoração. Se falasse como chefe de governo, estaria deixando no ar a impressão de que ele poderia estar em uma condição de romper com o princípio da impessoalidade, que é exigido pela Constituição a todos os governantes”, afirmou o estudioso.

Conforme destacou Bucci, autoridades públicas não podem subordinar um ato de governo a uma opinião pessoal que possa ter sobre um jornal ou sobre uma igreja. Assim, mesmo que considere uma publicação mais “objetiva” que outra, essa circunstância não pode interferir nos atos oficiais.

“O presidente pode pensar que uma determinada religião, ou igreja, ilude seus fiéis. Mas isso não dá a ele a atribuição de dirigir um tratamento diferenciado à igreja ou religião que ele não goste”, explicou.

Sobre a declaração de Bolsonaro relacionada a recursos federais, Bucci lembrou que, se o governo quer comprar um espaço publicitário em algum veículo de comunicação para alcançar determinado público, esse ato deve ser “instruído e motivado” pelos parâmetros de “impessoalidade” estabelecidos pela Constituição.

Por fim, o professor relativizou um pouco as afirmações do presidente eleito. “Não podemos levar tão a sério, tão ao pé da letra, esse tipo de ameaça que Bolsonaro deixou no ar. É uma declaração infeliz e, se fosse de um governante empossado, seria temerária e indevida”, completou.

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) também demonstrou preocupação com as atitudes de Bolsonaro relacionadas à imprensa. Em nota pública, a entidade afirmou que recebe com “apreensão” as declarações sobre imprensa feitas pelo presidente eleito depois da confirmação da vitória nas urnas. “O respeito à Constituição – à qual o presidente fará um juramento solene de obediência no dia 1º de janeiro de 2019 – não é pleno quando a imprensa se converte em objeto de ataques e de ameaças”, registrou.

Outra manifestação sobre o assunto, também em nota, foi feita pela Associação Nacional de Jornais (ANJ). A entidade “rejeita com veemência os termos e o teor das declarações” do presidente eleito. “Eventuais inconformismos com noticiário de veículos de comunicação não podem ser confundidos com inaceitáveis retaliações a jornais por meio de uso de verbas publicitárias oficiais”, ressaltou.

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