Análise: manifestantes terão de engolir o STF, como fez o PT

Próximos julgamentos decidião questões que podem esvaziar Lava Jato e aumentar a insatisfação dos críticos do Supremo Tribunal Federal

Eumano Silva
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A Constituição de 1988 garante o direito a manifestações de rua, como as deste domingo (17/11/2019), contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A liberdade para realizar protestos pacíficos faz parte das conquistas dos brasileiros na redemocratização do país.

No mesmo contexto, pertence ao STF a prerrogativa de proferir a última palavra sobre a interpretação do texto constitucional. Essa é uma realidade que vale para todo cidadão, seja oposicionista ou defensor do governo.

Portanto, apesar da insatisfação dos manifestantes de domingo, as decisões do Supremo estão acima da vontade de qualquer grupo da sociedade. Em uma democracia, não pode ser diferente.

Não adianta jogar tomates nas imagens do presidente do STF, Dias Toffoli, e do ministro Gilmar Mendes. Bater continência para uma réplica da Estátua da Liberdade e entoar a Canção do Exército também não mudam o papel dos onze integrantes da cúpula do Judiciário.

Os protestos do fim de semana – bem mais expressivos nas redes sociais do que nas ruas – foram motivados pela decisão do Supremo que derrubou as prisões de condenados em segunda instância. Na verdade, especificamente, os manifestantes se mostram revoltados com a libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

As pressões sobre o STF pela prisão do petista são antigas, remontam ao tempo do mensalão. Nesse sentido, o lance mais antidemocrático teve como protagonista, em 2018, o comandante do Exército, Eduardo Villas Boas, autor de um tuíte com ameaças veladas ao Supremo na véspera do julgamento de um habeas corpus em favor de Lula. Em uma ditadura, esse tipo de gesto seria normal, mas as Forças Armadas foram apeadas do poder em 1985.

Por mais que esperneiem, os revoltados de verde-amarelo terão de se conformar com as decisões do STF quaisquer que sejam os resultados. Assim como o PT teve de engolir os julgamentos do mensalão e da Lava Jato – que levaram os principais dirigentes do partido para a cadeia -, os antipetistas precisarão aceitar os votos dos magistrados caso discordem dos seus resultados.

Até o final do ano, pelo conteúdo da pauta, o STF julgará ações que, por provocar impacto na Operação Lava Jato, têm potencial para provocar mais revolta dos mesmos grupos. Um dos casos definirá, por exemplo, se serão anuladas as sentenças em que os réus não tiveram tempo para se defender de acusações de delatores.

Outro ponto da pauta vai esclarecer se o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro – quando era juiz –, foi parcial ao condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Com as revelações do site The Intercept sobre os bastidores da Lava Jato, esse tema ganhou ainda mais relevância.

O primeiro dos julgamentos que podem afetar a operação será nesta quarta-feira (20/11/2019), quando os ministros decidirão se devem ser suspensas as investigações que usam dados do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Nesse item, especificamente, existe uma contradição na turma de verde-amarelo.

Embora os manifestantes sejam, evidentemente, seguidores do presidente Jair Bolsonaro (PSL), a pendência em torno do Coaf não atende aos interesses da família palaciana. A suspensão das investigações que obtiveram informações do Coaf foi provocada por uma ação do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho mais velho do chefe do Executivo.

Envolvido nos rolos do ex-assessor Fabrício Queiroz, o “Zero 1” atua para derrubar esses processos. A propósito, se o STF entender que os dados do Coaf podem ser usados, Flávio Bolsonaro também terá de se curvar à força da lei. Assim como fez o PT, apesar dos protestos.

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