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Governo monta “tropa de choque” para tentar mudar imagem externa do Brasil

Foco é tirar a pecha de que o país trata mal os assuntos relacionados ao meio ambiente. Empresários alertam para riscos de desinvestimento

atualizado

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Michael Melo/Metrópoles
Bandeira da Republica Federativa do Brasil
1 de 1 Bandeira da Republica Federativa do Brasil - Foto: Michael Melo/Metrópoles

Aumento do desmatamento e das queimadas, garimpo ilegal, demarcação de terras indígenas, grilagem em reservas ambientais. A lista de notícias negativas ligadas ao meio ambiente e a percepção sobre como age o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nesses temas colocaram o Brasil em uma posição delicada no cenário internacional, sob o risco de perder financiamento para setores estratégicos, como agronegócio e a indústria de extrativismo.

Após embates com líderes mundiais, ambientalistas e ONGs, agora, o governo federal monta uma força-tarefa para tentar apaziguar a situação e evitar a perda de investimentos. A pedido do Palácio do Planalto e da Casa Civil, será conduzida uma “estratégia internacional” para mudar a imagem do país. Uma espécie de “tropa de choque” será montada.

Capitaneada pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE), a estratégia prevê um braço de negociações bilaterais e outro de convencimento de investidores com campanhas focadas na opinião pública. A empreitada envolve ainda os ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, além do Banco Central. O objetivo é vender a imagem de um país que pensa no avanço econômico e na agricultura, e que, embora defenda mudanças no setor, se pauta pelo desenvolvimento sustentável.

Como parte desse movimento, Ernesto Araújo iniciou mudanças na sua equipe de comunicação, a qual atribuiu “pouca familiaridade” com a agenda ideológica. O antigo chefe da assessoria de imprensa do ministério, Alexandre Brasil, foi desligado da função. A ideia é ter pessoas alinhadas ao pensamento do governo nesses cargos.

Bolsonaro deu início a essa estratégia em encontro com líderes do Mercosul, quando defendeu que há uma “opinião distorcida” no exterior sobre a forma com que o atual governo trata do meio ambiente. Os ministérios agora terão a missão de ecoar a mensagem.

Críticas recentes

A mais recente crítica à forma sobre como o Brasil trata o meio ambiente veio de um grupo de 40 empresários dos setores do agronegócio, de serviços, bancos e indústria. Em carta ao vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB), que também é presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal (grupo governamental de defesa do bioma), eles pedem fortalecimento no combate ao desmatamento na região.

Segundo o grupo, a imagem negativa do Brasil no exterior em relação às questões socioambientais tem impacto não apenas na reputação do país junto à opinião pública global, mas também nos negócios realizados por essas companhias. O documento foi encaminhado a Mourão nesta terça-feira (7/7).

É a segunda vez que isso acontece. No fim de junho, um grupo de investidores internacionais que administram fundos bilionários também enviou uma carta aberta a embaixadas brasileiras em oito países manifestando preocupação com o aumento do desmatamento no país.

“Esdrúxulo”

Para Carlos Manhanelli, presidente da Associação Brasileira dos Consultores Políticos, especialista em marketing político, a intenção do governo pode esbarrar na ausência de lastro para lançar tal iniciativa. Ele destaca que a gestão Bolsonaro não tem números, como de queda do desmatamento e das queimadas, para apresentar como resultado de suas políticas. Pelo contrário, o desmatamento e as queimadas vêm batendo recordes.

“É uma iniciativa esdrúxula. Vai convencer quem? Uma campanha você faz para convencer alguém. A depender de como será executada, vai bater de frente com os órgãos internacionais que poderiam dar credibilidade às falas”, explica.

Manhanelli pondera que a imagem do Brasil no cenário internacional já vem há muito tempo se deteriorando e isso vem surtindo impacto na entrada de dinheiro no país. “Tivemos o caso da Alemanha e da Noruega cortando investimentos. A situação só foi se agravando com mais queimadas. As ONGs se rebelaram e denunciaram descaso. Não tem outra forma. Contra fatos, não há argumentos”, finaliza.

Dificuldades internas

Mesmo dentro do governo, as expectativas de algumas alas para o sucesso da campanha não são altas. Dois fatores são primordiais neste cenário: a resistência dos mercados internacionais aos ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente) e ao chanceler Ernesto Araújo (Relações Exteriores).

Segundo assessores do Ministério do Meio Ambiente, a “estratégia internacional” esbarra na própria essência do atual governo. Salles é favorável à liberação de garimpos e ao perdão a grileiros e já fez defesas públicas nesse sentido. Além disso, o termo “passar a boiada”, usado por ele na reunião do dia 22 de abril, revelada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), marcou a sua imagem, acreditam os assessores.

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação de improbidade administrativa contra Salles nessa segunda-feira (6/7). O ministro é acusado de “desestruturação dolosa das estruturas de proteção ao meio ambiente”. Assinada por 12 procuradores da República, a ação pede o afastamento do ministro em caráter liminar, ou seja, imediatamente.

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A carta na manga para tentar acalmar os investidores é uma atuação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. No entendimento do governo, ele circula fácil pelo mercado financeiro internacional, além de ter uma boa rede de contatos.

Versão oficial 

Durante os últimos dois dias o Metrópoles questionou os palácios do Planalto e do Itamaraty, e os ministérios do Meio Ambiente e o da Agricultura, Pecuária e Abastecimento sobre os projetos do governo. O Planalto confirmou a elaboração da estratégia e informou que o Ministério do Meio Ambiente detalharia a proposta.

Nesta terça-feira (7/7), por sua vez, a pasta transferiu para o Itamaraty a responsabilidade de comentar o assunto. A pasta, no entanto, não respondeu. O espaço continua aberto a esclarecimentos.

Em nota, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento informou que não comenta o assunto.”Esse tema não é tratado individualmente pela pasta. Eventuais análises ou decisões de governo são coordenadas pela Casa Civil da Presidência e Conselho da Amazônia”, destaca o texto.

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