O sistema fiduciário (por Ricardo Guedes)
No Brasil, falta uma elite no sentido descrito por Wright Mills em The Power Elite
atualizado
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Segundo o Cambridge Dictionary, o conceito de fiduciário é “relacionado às responsabilidades de uma pessoa ou organização que lida com a propriedade ou dinheiro que pertence a outra pessoa ou organização”. Este conceito se estende à credibilidade da “moeda”, à responsabilidade dos “pais na salvaguarda do futuro dos filhos”, do “médico para com os seus pacientes”. Do fiduciário da sociedade em geral. Quando você paga ou recebe um valor, você acredita em que a moeda expresse aquele valor.
Nos Estados Unidos, a fidúcia é ancorada em três alicerces, do individualismo, onde a liberdade econômica e política de cada um termina onde a do outro começa, do trabalho, o elemento básico da produção na sociedade, e da responsabilidade, no atendimento à normas e processos, regimentados em Lei.
No Brasil, falta uma elite no sentido descrito por Wright Mills em The Power Elite, que conjugue o empresário, o militar, o político e o acadêmico na avaliação e formação contínua de um projeto para o país. Ou das elites criativas presentes em Arnold Toynbee em A Study of History, que dão um rumo ao país.
O Elite Quality Report de 2022, que compara 104 países segundo a capacidade inclusiva e distributiva da riqueza através do estudo da tributação e legislação, atribui à elite brasileira a 96ª colocação, atrás da China, Colômbia e do Gabão. Suécia, Nova Zelândia e Dinamarca lideram o ranking. A elite brasileira não se interessa por um modelo equilibrado de sociedade. No IDH, Índice de Desenvolvimento Humano que mede a qualidade de vida em função bens e serviços, o Brasil encontra-se na 84ª posição com 0,77, Noruega em primeiro com 0,96. No Brasil, o individualismo é exacerbado. No bolsonarismo, recente fenômeno de nosso país, o individualismo é mais do que exacerbado, o trabalho é escasso, e a responsabilidade é a da usurpação.
Sobra ao Brasil sua arte e a cultura, belíssimas, como colocado por Roberto da Matta em O que faz do brasil, Brasil, o primeiro Brasil com b pequeno, de nossa situação social, o segundo Brasil com B maiúsculo, de nossa música, carnaval e futebol. Têm a força do universalismo e do igualitário, na inversão dos valores econômicos por ora predatórios de nossa sociedade. Por isso, o bolsonarismo tanto detesta a cultura. Mas são aspectos culturais, que expressam mais nossas vontades, esperanças, e convívio social, não suficientemente fortes para alterar o que então parecem ser os rumos de nosso destino. Mas que nos alegram. Pobre Brasil!
Ricardo Guedes é Ph.D. pela Universidade de Chicago e CEO da Sensus