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O príncipe malvado (por Tânia Fusco) 

Em 507 páginas, às vezes quase infantil, o príncipe Harry passeia por dores e estripulias do cotidiano dos seus 38 anos vividos

atualizado

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Amazon UK/Divulgação
Capa do livro Spare, autobiografia do príncipe Harry. A foto de capa é um retrato do rosto do Harry, um homem branco e jovem, de olhos azuis e cabelos e barba ruivos. - Metrópoles
1 de 1 Capa do livro Spare, autobiografia do príncipe Harry. A foto de capa é um retrato do rosto do Harry, um homem branco e jovem, de olhos azuis e cabelos e barba ruivos. - Metrópoles - Foto: Amazon UK/Divulgação

O Que Sobra – Spare, em inglês – livro autobiografia do príncipe Harry, da Inglaterra, teve da imprensa internacional muito nariz torcido e algum deboche. Mas vende como pão quente mundo afora.  Fará mais rico o filho caçula da icônica Diana, falecida, com Charles III, prestes a ter na cabeça a coroa de soberano do Reino Unido.

O livro é farto em revelações sobre a corte inglesa – picuinhas internas entre uns e outros, rasteiras nada nobres e, principalmente, usos e abusos na sorrateira utilização da imprensa.

Conta Harry, as news difamadoras contra uns e outros têm como fontes membros da família através de offs de suas pomposas assessorias de imprensa/zeladora de imagem pública.

Pelo olhar de Harry, a hierarquia de poder deve inclusive ser respeitada nos espaços de mídia. Quem, fora da ordem de sucessão, começa a aparecer demais – e bem na foto – padece mais com matérias e notas pouco ou nada lisonjeiras. Nem verdadeiras.

O livro é um rosário de queixas sobre o comportamento da família e, principalmente, dos tabloides ingleses, capazes de tudo – até invadir telefones e celulares, ou usar documentos falsos – para futucar qualquer migalha da vida da realeza. Insiste Harry, desde Diana, as invenções publicadas, quase sempre, têm DNA de algum membro da família real.

Sugere que assessores de Camila, eterna namorada/amante do pai Charles, hoje esposa e quase rainha, foram boas fontes de maldades mediáticas contra ele e a mulher Meghan – inclusive no vazamento de sua disposição de deixar as funções de membro da monarquia. Suspeita que o irmão Willian também teria usado desses expedientes.

Estudiosos dos caminhos percorridos pela imprensa, que chegam até a libertinagem dos espaços da comunicação nas redes sociais de hoje, apontam a Inglaterra como origem do jornalismo invasivo e de escândalos. Lady Di seria a primeira e principal vítima desse modelo de comunicação.

Verdade é que a “princesa do povo” viveu e morreu caçada por paparazzis. Não porque era princesa, bela, ousada e transgressora, mas porque cada foto sua publicada levava milhões aos cofres do veículo publicador. Além de algum aos bolsos do paparazzo autor da foto.

À parte as dores de Harry, chegamos à decadência dos paparazzis e a “monetização” de hoje às publicações da Internet, medidas principalmente pela “taxa de engajamento”, que é o nível de interação dos usuários alcançados por um post ou página.

Simplificando muito, mais do que o número de seguidores, a taxa de engajamento inclui reações, compartilhamentos, comentários e cliques. Isso define o valor, o dindin, que cairá na conta do publicador ou da publicação.

Mundo afora, há milhares dos ditos “influencers” feitos milionários por números de seguidores e, principalmente, pelas taxas de engajamentos em suas publicações.

Com números de leitores e de publicidade minguados nas páginas impressas, jornais e revistas, investem em suas publicações eletrônicas. Aí, nesses noticiários on-line, esbarramos toda hora com títulos chamativos, escandalosos que nem refletem o que relata a matéria. O título fez você abrir e ler o texto. Ou até compartilhar sem ler o dito cujo. Isso e mesmo sua indignação num comentário resultam em melhoria na taxa de engajamento.

Escândalos, desgraças e provocações rendem mais cliques, likes e compartilhamentos, que compõem as fórmulas de medidas para mais publicidade e melhor monetização na comunicação eletrônica.

O modelo qualquer-coisa-por-dinheiro teria ganhado força nos anos 80/90, com o uso de paparazzis que infernizaram a vida de Diana e de outros famosos, particularmente na Inglaterra e nos Estados Unidos?

O Que Sobra é best-seller.   Já vendeu 1,43 milhão de cópias nos Estados Unidos, Canadá e Reino Unido,  incluindo pré-encomendas, de acordo com sua editora, Penguin Random House. Ultrapassou alguns dos maiores sucessos do segmento, como os livros de Barack e Michelle Obama. Em vendas antecipadas, o livro rendeu 16 milhões de libras. O que equivale a mais de R$ 102,8 milhões. E é só o começo.

Bocudo, o príncipe ruivo e rebelde, perdeu popularidade na Inglaterra, mas hoje tem mais “engajamento” nas redes sociais do que seus nobres pai Rei e seu irmão Príncipe Herdeiro. No livro, além do muito amor declarado à Inglaterra, à mãe falecida, à Meghan, aos filhos – Archie e Lilibet -, elogia a sogra, relata que cortou o sogro fofoqueiro da vida familiar.

Em 507 páginas, às vezes quase infantil, Harry passeia por dores e estripulias do cotidiano dos seus 38 anos vividos. Com naturalidade, diz que foi péssimo aluno e não é muito letrado. Conta que fumou maconha – e ainda curte um baseado -, cheirou cocaína, comeu cogumelos alucinógenos. Mentiu pra família pra se safar de encrencas. Sofreu com pênis congelado em viagem ao Polo Norte. Como oficial do Exercito, matou inimigos na guerra no Afeganistão.

Apesar das dores familiares relatadas, Harry não fecha o livro sem reforçar amor pelo pai, pelo irmão e sobrinhos. (A madrasta Camila e a cunhada Kate sobram nesse rol de amores).

Irá à coroação do pai?

 

Tânia Fusco é jornalista 

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