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Foice, martelo, suástica e chips (por Cristovam Buarque)

Bolsonaro fomentou o nazismo, mas o ressurgimento da suástica nas escolas tem mais a ver com o fracasso de utopias e sonhos da esquerda

atualizado

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Aluno faz gesto nazista diante de quadro com a bandeira nazista projetada em sala de aula no colégio Ciman - Metrópoles
1 de 1 Aluno faz gesto nazista diante de quadro com a bandeira nazista projetada em sala de aula no colégio Ciman - Metrópoles - Foto: Redes Sociais

Os discursos de ódio do ex-presidente ajudaram a fomentar o nazismo, mas o ressurgimento da suástica nas escolas tem mais a ver com o fracasso de utopias e sonhos da esquerda, do que com a força e inspiração da direita. A suástica ressurge nas escolas, por falta de bandeiras que atendam as aspirações dos jovens, de maneira compatível com a realidade onde vivem e o futuro em que viverão.

A nostalgia serve à direita, não à esquerda. A direita pode defender até mesmo o retorno da escravidão, à esquerda não basta defender a Abolição, tem de propor o fim de toda escravidão aue ainda resta: pobreza, preconceitos, desastre ecológico, desigualdade escolar. A direita pode voltar ao nacionalismo nazista, a esquerda se desfaz quando não oferece sonhos futuristas para a sociedade, capazes de usar plenamente as invenções tecnológicas para construir um mundo melhor e mais belo. Nostalgia não é cimento para o futuro. A foice e o martelo não servem para o tempo dos chips. Mas a esquerda continua nostalgicamente mecânica. Dividida entre os que abandonaram seus símbolos e sonhos e aqueles que ainda mantém os mesmos símbolos e sonhos do passado. Incapaz de formular novas leis trabalhistas contemporâneas para os novos tempos: dos limites ao crescimento, da modernidade fluída, da robótica, do trabalho temporário, das profissões provisórias, do esgotamento das finanças do estado, da globalização avassaladora. Percebendo estas curvas da história, alguns progressistas abandonam o passado e caem em um futuro conservador, outros se mantêm fiéis ao passado e perdem sintonia com o futuro. Diante da obsolescência das velhas leis trabalhistas, os primeiros defendem reformas que tiram direitos dos trabalhadores, os outros se negam a propor reformas que aumentem direitos, mas de forma compatível com a realidade mutante. O mundo ficou digital, mas a esquerda continua analógica.

Os jovens caem no nazismo por falta de outras bandeiras sedutoras, utópicas e viáveis, sintonizadas com o futuro. Caem na nostalgia perversa do nazismo por culpa do vazio daqueles que deveriam lhes oferecer alternativas progressistas.

A juventude não vê esperança e progressismo nos discursos antigos, e por falta de uma luz adiante caem no abismo do nazismo: com esperança no desespero. No lugar de derrubar a barreira em frente, preferem a ilusória liberdade de se jogar no abismo adiante. A culpa não é deles. É preciso afasta-los desta tentação, mas não apenas pela repressão. Sobretudo pela: educação, mostrando o que foi o nazismo, a inspiração, acenando com a possibilidade de um mundo melhor e mais belo, e a mobilização para a luta por este novo mundo. Sem suásticas, muito além da foice e o martelo, com o uso moralmente correto dos chips.

Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador

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