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Construindo o atraso do Brasil (por Eduardo Fernandez Silva)

Continuam a buscar o “crescimento do PIB” acima de tudo e celebram a expansão de setores com elevadas emissões de carbono

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Foto colorida mostra emissão de carbono na atmosfera - Metrópoles
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A União Europeia está implantando importantes iniciativas para cortar suas emissões de gases de efeito estufa em 55% até 2030. Entre elas, a inclusão de novos setores no mercado de carbono e a elevação do custo de emitir GEE. Para evitar que empresas europeias sejam prejudicadas será instituída uma taxa sobre importações de produtos que liberam muito carbono, produzidos em países que não aplicam penalidades à emissão de GEE. É o “mecanismos de ajuste fronteiriço”, com a sigla CBAM, do inglês. Embora com atraso, também os EUA devem seguir no mesmo caminho. Claro, o Brasil será afetado.

Já era previsível que medidas dessa natureza viriam, pois a questão ambiental assume importância crescente globalmente. Os governantes brasileiros, porém, nada fizeram para preparar o país, pelo contrário. Ainda orientados por ideias de economistas mortos, continuam a buscar o “crescimento do PIB” acima de tudo e celebram a expansão de setores com elevadas emissões (desmatamento, extração de petróleo e pecuária). Nesse quadro, a questão não é se mas quando serão impostas taxas sobre os produtos que exportamos.

A inação brasileira na questão climática e, mais recentemente, o retrocesso na questão ambiental, reproduzem, após mais de um século, o atraso em tornar ilegal a escravização de pessoas. Nos anos 1850 já era claro que manter a escravidão se tornaria inviável, mas não nos preparamos.

Já nos cem anos após 1850 nos aferramos à leitura ortodoxa do liberalismo e permanecemos “um país essencialmente agrícola”; não adotamos, como fizeram os países hoje ditos “desenvolvidos”, políticas públicas promotoras da educação, da ciência e da indústria.

Avançando no século XXI, descartamos a cada vez mais importante questão ambiental. Fizemos uma Lei de Resíduos Sólidos, e permitimos o recorrente adiamento das datas em que seus objetivos deveriam ser alcançados. Da mesma forma, com a questão da água. Com relação ao clima, definimos metas de longo prazo mas não os instrumentos para alcançá-las.

Como disse a revista The Economist de 17/07/21, definir metas para 2050 é fácil, pois os atuais dirigentes não mais estarão no comando; difícil é defini-las para 2030, quando eles esperam ainda estar no poder.

Ao não agir, com base no falso pressuposto de que a ação prejudicará as empresas e o “crescimento”, ficam incentivadas localmente atividades que, globalmente, estão fadadas ao declínio. Não há pressão para que inovações coerentes com a nova realidade, em construção, sejam buscadas.

E assim, atendendo a demandas dos lobbies, e orientados pelas ideias de economistas mortos, nosso atraso vai sendo construído.

Estamos a pouco mais de um ano da escolha de um novo presidente. Pelo que se vê, e pelo silêncio dos pretensos candidatos com relação aos problemas globais do século XXI, nada indica que teremos a chance de superar essa persistente construção do nosso subdesenvolvimento.

Eduardo Fernandez Silva. Ex-Diretor da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados

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