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Autópsia do golpe de 8 de janeiro (por João Bosco Rabello)

Uma intentona, com participação militar e de cúpulas de polícias

atualizado

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Reprodução/Câmara dos Deputados
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É muito grave o conteúdo do relatório apresentado pelo interventor na segurança pública do DF, Ricardo Cappeli, sobre os acontecimentos de janeiro em Brasília, que culminaram com as invasões dos prédios dos três poderes da República.

Ainda que Cappeli, por dever funcional, tenha recusado avançar no envolvimento de outros atores desse enredo, como as Forças Armadas e os financiadores, a simples descrição dos fatos apurados – e documentados – não deixa dúvida quanto a isso.

Incisivo no seu depoimento, e cuidadoso na interpretação, o interventor descreve o que merece o nome correto: uma intentona, com participação militar e de cúpulas de polícias. A trama evoluiu por omissões premeditadas, mas tinha vasos comunicantes, que agora ganham visibilidade.

O ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, assumiu a Secretaria de Segurança Pública do DF, demitiu todo o comando, pôs na gaveta um relatório da inteligência, do dia 6, que previu de forma explícita as invasões do dia 8, e deixou o país em seguida, um dia antes do início de suas férias.

O acampamento dos terroristas na porta do QG do Exército teve privacidade para planejar atos e abrigo para fugir da polícia. Tão estruturado, mereceu do interventor a classificação de “uma minicidade”.

Cappeli chamou de ponderações as sucessivas recusas do Comandante Militar do Planalto, general Gustavo Henrique Dutra, para permitir o desmonte do acampamento em área de jurisdição do Exército. Não se pondera com tanques apontados para a Polícia Militar como ocorreu na noite dos atentados, evitando prisões em flagrante. Foi bloqueio mesmo.

É importante lembrar que a duração do acampamento – dois meses – foi simultânea ao vácuo administrativo e político deixado pelo governo Bolsonaro durante a transição, uma vez já derrotado nas urnas. O ataque aos três poderes esperou a posse de Lula e a saída de Bolsonaro do país. Já nos EUA, Bolsonaro disse a uma militante que o visitou: “O melhor está por vir”.

Um detalhe do relatório revela uma tática militar clássica de recuar para avançar. Antes do ataque na praça dos três poderes, o acampamento foi esvaziado voluntariamente, sugerindo uma renúncia de seus manifestantes à causa de reverter o resultado eleitoral.

Uma cilada para desarmar reações. De um dia para o outro reocuparam o espaço e, dali, armaram bombas e marcharam escoltados para a Esplanada no dia 8.

O relatório, pela cronologia que descreve dos fatos, comportamento de comandos e comandantes, perícias localizadas, áudios e vídeos, depoimentos e informações precisas, vai acrescentar às investigações muito mais do que possivelmente se podia esperar de apurações oficiais.

É matéria-prima para a Polícia Federal e o Supremo Tribunal Federal trabalharem com elementos de riqueza investigativa suficiente para identificar culpados, responsabilizar militares e policiais e abrir espaço para que a ordem unida nos quartéis, a cargo do novo comandante do Exército, resulte em punições a oficiais envolvidos na conspiração.

Esse é o primeiro relatório das investigações que chega ao público. E, por ele, já não se sustentam as críticas ao presidente Lula pela perda de confiança nas Forças Armadas.

Estas, não têm do que reclamar. Precisam responder com base no fundamento principal da instituição, que é a reposição da hierarquia e disciplina e sua consequente despolitização. Estão no palco do striptease do golpe.

E o Congresso, se tiver juízo, deve começar a debater e aprovar uma revisão do papel das Forças Armadas para exorcizar o fantasma de golpes militares presentes desde sempre em nossa história política.

 

João Bosco Rabello é jornalista há 45 anos e participa da cobertura política em Brasília desde 1977. Suas colunas são publicadas semanalmente no site colunadobosco.com e no Twitter @jboscorabello. É autor do Podcast “Política com Bosco”, no Spotify, participou de coberturas históricas e integrou a equipe pioneira no Brasil do noticiário em tempo real da Agência Estado/Broadcast

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