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Aliança inimaginável (Por André Gustavo Stumpf)

Interesses acima da ideologia no caso da mudança de composição do Conselho Nacional do Ministério Público

atualizado

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Pedro França/Agência Senado
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1 de 1 senado plenário congresso - Foto: Pedro França/Agência Senado

A Revolução Francesa, de 1789, viveu diversas fases e terminou por criar o estado moderno, além de auxiliar o surgimento da democracia nos Estados Unidos. Os principais líderes da revolução norte-americana passaram longas temporadas em Paris, bebendo na fonte os ensinamentos que brotavam daquele novo sistema de governo.

Mas o movimento francês também ensinou que os radicais, no caso os jacobinos, terminam sendo engolidos pela sua própria radicalização.

Danton, (‘l’audace, toujours l’audace /audácia, sempre a audácia’) terminou seus dias na guilhotina. Robespierre, um dos líderes do período do terror, também encerrou sua existência na máquina francesa de matar. Perdeu a cabeça. Antes, a dupla fez caminhar no cadafalso mais de 17 mil acusados de conspirar contra a República. Até o Rei Luís XVI foi executado em janeiro de 1793.

Mas, os girondinos tomaram o poder, reequilibraram o jogo político e abriram o espaço para o surgimento de Napoleão. Esta, no entanto, é outra história.

Importa notar que o radicalismo concorda com a lei da física. Provoca reação igual e contrária. Os jovens de Curitiba, chefiados pelo juiz Sergio Moro, adotaram uma linha jurídica parecida com a dos tribunais norte-americanos e avançaram na condenação de dúzias de políticos e empresários brasileiros.

Descobriram roubalheiras capazes de fazer corar os quarenta ladrões de Ali Babá, fortunas escondidas em paraísos fiscais ou em dinheiro, dentro de malas e outros recipientes atrás de paredes falsas. Teve gente que devolveu US$ 100 milhões aos cofres do governo.

O escândalo atravessou fronteiras. Atingiu outros países. Um ex-presidente da República, em país vizinho, se suicidou acusado de cometer ilicitudes com empreiteiras brasileiras que tinham obras em todos os países da América do Sul, na África, na Europa e até nos Estados Unidos. Um espanto!

Enfim, apareceu um gigantesco esquema de corrupção que transitou com desembaraço em todos os níveis de governo. Deputados, senadores, ministros foram atingidos. Uns foram presos, outros pagaram multas pesadíssimas e foram afastados da vida política nacional. Foi uma faxina muito bem realizada em todos os quadrantes do país.

Mas, o sucesso subiu à cabeça. O juiz Sérgio Moro acreditou nas promessas de Jair Bolsonaro. Cometeu o erro primário, básico e fundamental de aceitar o convite para ser Ministro da Justiça. Passou a ser acusado de ter supostamente favorecido a vitória eleitoral do novo presidente do Brasil.

Sua convivência com Jair Bolsonaro durou pouco. Entre ele e o chefe do governo havia interesses antagônicos, entre eles o controle da chefia da Polícia Federal no estado do Rio de Janeiro, onde há grande atuação das milícias, sobretudo na Barra da Tijuca. É onde reside o presidente e sua turma.

Moro caiu em desgraça, o que serviu de sinal para que, no Judiciário, aqueles que se sentiram ofendidos pelo desembaraço do juiz de Curitiba fossem para o ataque. Todas as suas decisões foram consideradas ineptas, transferiram para outro juízo o exame das provas e ele foi considerado parcial. Criaram uma espécie de auto de fé da contrarreforma. Imolaram o acusado em praça pública.

Na política, as reações aparecem de maneira insidiosa. Ninguém abre o jogo, mas o súbito interesse dos deputados em modificar o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) é sinal importante. A Proposta de Emenda Constitucional 5, de 2021, de autoria do deputado Paulo Teixeira (PT-SP) propõe aumento de vagas, sendo que a Câmara e o Senado passariam a indicar quatro conselheiros, um deles o vice-presidente e outro o corregedor. Ou seja, consagra a interferência do Legislativo no Judiciário.

Hoje só há membros do Ministério Público no Conselho. O presidente da Câmara, Arthur Lira, favorável ao projeto, tentou submetê-lo a voto, mas a reação em todo o país foi ampla, geral e irrestrita. A votação foi adiada.

O processo não terminou. O ex-juiz Sergio Moro namora a ideia de se candidatar à presidência da República. Contra ele estão petistas, políticos do centrão, atingidos pela lava jato, e alguns empresários. Ao lado dele, boa parte dos eleitores que acreditaram na possibilidade de combater a corrupção no Brasil e naturalmente parcela importante dos integrantes do Ministério Público.

A tentativa de modificar a composição do CNMP revelou uma aliança inimaginável: estão lado a lado na defesa deste estranho projeto líderes do PT e os expoentes do Centrão. Interesses acima da ideologia. Retrato da política brasileira.

André Gustavo Stumpf escreve no https://capitalpolitico.com/

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