Disputas políticas mundiais se transferem para o Rio-2016
Nos últimos dias de provas, incidentes diplomáticos foram registrados entre atletas, causando saia justa e mesmo protesto políticos por parte de governos
atualizado
Compartilhar notícia
A ordem era de tolerância. Mas, mesmo no mundo olímpico, as barreiras políticas e ideológicas se fazem presentes no Rio de Janeiro. Nos últimos dias de provas, incidentes diplomáticos foram registrados entre atletas, causando saia justa e mesmo protesto políticos por parte de governos.
Neste ano, pela primeira vez, o Comitê Olímpico Internacional (COI) fez uma homenagem aos atletas israelenses mortos em um atentado terrorista nos Jogos de Munique-1972. Neste domingo, num evento com a presença de autoridades, uma vez mais o drama foi lembrado.Mas o ato do COI não foi suficiente para reduzir a tensão entre árabes e judeus dentro da Rio-2016. Na semana passada, o judoca egípcio, Islam El Shehaby se recusou a cumprimentar o israelense Or Sasson, após ser derrotado. Neste domingo, Sasson admitiu que já havia sofrido esse tratamento antes e que seus colegas passam por isso “com muita regularidade”.
Uma das viúvas do massacre de 1972, Ankie Spitzer, também destacou a iniciativa do COI. Mas não deixou de atacar as ofensas que os atletas continuam sofrendo. “Uma pessoa assim não tem lugar nos Jogos”, disse a esposa do técnico de esgrima, Andre Spitzer, morto há 44 anos.
A ministra dos Esportes de Israel, Miri Regev, também usou o evento para pedir o “fim de discriminação” contra atletas israelenses e, apesar de elogiar o COI, insistiu que um minuto de silêncio precisa ser estabelecido em todas as cerimônias de abertura dos Jogos.
A situação levou até mesmo o chanceler José Serra a reagir. Segundo ele, os incidentes contra atletas israelenses no Rio são “deploráveis”. Falando em nome do presidente em exercício Michel Temer, o chanceler denunciou o terrorismo, atacou o fanatismo e alertou que o COI foi “omisso” por muitos anos. Mas deixou clara a posição política brasileira de aceitar as fronteiras do Estado Palestino. “Somos um país que constrói pontes”, disse, defendendo a paz em Israel, mas também nos países vizinhos.
Mark Adams, porta-voz do COI, confirmou que um processo no Comitê de Ética foi aberto contra o judoca para avaliar o caso. “Isso é inaceitável. Não existe desculpa para tal ato”, insistiu. Ele também deixou claro que não aceitará comentários antissemitas durante o evento.
Mas esse não foi o único caso envolvendo a delegação de Israel. No caminho para a cerimônia de abertura, na sexta-feira, um ônibus que levaria os atletas registrou um incidente entre libaneses e israelenses. O grupo de Beirute teria impedido a entrada dos atletas de Israel no mesmo veículo. Israel, por sua vez, havia bloqueado o envio de uniformes da delegação da Palestina que viajou ao Rio de Janeiro.
Barreiras culturais e políticas também foram constatadas no Rio. No judô, o sorteio para as competições colocou, na primeira rodada, uma disputa entre Arábia Saudita e Israel. A judoca saudita anunciou que tinha quebrado a mão e não lutou, levantando suspeitas de que o motivo tenha sido político.
No início da semana, o governo da Sérvia anunciou que estava recomendando a seus atletas que não subissem a um pódio se, entre os medalhistas, estivesse um atleta do Kosovo. O COI reconheceu o Kosovo. Mas Belgrado continua uma campanha mundial para impedir que o novo país e sua ex-província ganhe reconhecimento.
Outro protesto foi dos países da francofonia, que se queixaram que a língua francesa não está exposta de forma suficiente no Parque Olímpico. O COI tem em suas regras a exigência do uso do francês, inclusive nos cartazes com direção. Mark Adams, porta-voz do COI, indicou que o evento precisa se adaptar aos mercados onde ocorre. Mas, diplomaticamente, apontou que o francês “é muito importante”.
Quem também protestou foi a China. Desta vez, o motivo era sua bandeira. O símbolo nacional usado no evento no Rio não era a oficial, ainda que a diferença seja imperceptível para um estrangeiro.
O Comitê Rio-2016 explicou que a bandeira usada havia sido aprovada por diplomatas chineses no Brasil. Mas Pequim não ficou satisfeita com a resposta e exigiu uma mudança. A empresa brasileira foi obrigada a acelerar uma nova produção.
Não faltaram ainda os ataques de atletas a outros governos. O nadador australiano, Mack Horton provocou a China ao alegar que um de seus rivais, Sun Yang, estaria dopado e seria ajudado pelo seu país. Entre os atletas, o clima foi o da volta de um tom de Guerra Fria, com acusações do Ocidente sobre práticas de doping de Rússia e China.