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Escritor Julián Fuks debate literatura e política em palestra no CCBB

Em entrevista ao Metrópoles, o autor comenta sobre os rumos do romance no Brasil

atualizado

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Kácio Pacheco/Metrópoles
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1 de 1 julian-fuks1 - Foto: Kácio Pacheco/Metrópoles

O escritor paulista Julián Fuks desembarca em Brasília para participar do projeto Literaturas, que ocorre nesta segunda-feira (22/5) no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). No encontro, ele fala sobre questões que envolvem o romance, o conto e a crítica literária brasileira da atualidade.

O debate é aberto ao público e está marcado para ocorrer das 20h às 21h30 no Teatro I do CCBB – a senha é distribuída 1h antes do início. O professor da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Paniago será responsável por mediar o encontro e o ator Luiz Felipe Ferreira fará algumas leituras dramáticas das obras escritas por Fuks.

Em entrevista ao Metrópoles, o escritor – que é doutor em literatura pela Universidade de São Paulo (USP) e ganhador do Prêmio Jabuti de 2016 pelo romance “A Resistência” – discute sobre o cenário literário do Brasil na atualidade. “Hoje, é quase inevitável que os escritores se vejam tocados pelo momento crítico vivido, momento de tantos retrocessos assustadores no Brasil”, afirma Julián Fuks.

Metrópoles – Além de escritor, você é doutor pela USP em Teoria da Literatura. Sua atividade dentro da academia influencia, de algum modo, a produção de suas obras literárias?
Julián Fuks – 
Pensar e escrever literatura nunca se diferenciaram muito para mim, uma atividade foi sempre a contraface da outra. Não consigo conceber um romance próprio sem me indagar sobre a pertinência que o gênero ainda pode ter, sem me perguntar o que ainda cabe a essa forma literária, que novidades nosso tempo lhe reserva. Talvez por isso meus livros sejam sempre tão metalinguísticos, autorreflexivos, desdobrando em sua forma algo dessas perguntas que costumeiramente me visitam.

Renato Parada/DivulgaçãoMetrópoles – Como você avalia o atual cenário da literatura brasileira?
Fuks – 
É claro que toda literatura é sempre plural e múltipla, mais marcada por singularidades do que por tendências gerais. Mas sinto que, em nossa literatura, como em tantas outras, o que tem se ressaltado é uma ficção que se deixa permear de forma mais direta pelo real, o romance que se faz um gênero híbrido, mais próximo à historiografia, ao ensaio, à biografia. Muitas outras práticas convivem com essa, mas me interessa em particular esse hibridismo pelo modo como reconfigura a experiência da leitura, estabelecendo entre autor e leitor um pacto ambíguo, a um só tempo de confiança e desconfiança. Vejo aí uma das novidades mais potentes que o romance contemporâneo apresenta.

Metrópoles – As mudanças no cenário político nacional também vem mexendo com o universo da literatura, provocando autores como Ricardo Lísias e Raduam Nassar. Você acredita que o universo da literatura deve se envolver com os fatos que escapam à escrita?
Fuks – 
Sempre convém descartar imperativos para a escrita, afirmações taxativas de que a literatura deve ser tal coisa – neste caso, por exemplo, de que a literatura deve ser engajada ou política. Mas hoje é quase inevitável que os escritores se vejam tocados pelo momento crítico que temos vivido, momento de tantos retrocessos assustadores no Brasil e no mundo, e que suas obras acabem por refletir essa dura perspectiva. Ganham relevância, nesse contexto, obras que se fazem mais contundentes e incisivas, que conseguem apreender algo desses fenômenos contemporâneos, que encontram sentidos na barafunda de conflitos em que estamos imersos.

Metrópoles – Recentemente, morreu Antonio Candido, um dos expoentes da crítica literária brasileira. Quais são os rumos da crítica nacional da atualidade? Ainda seguimos o caminho que Cândido trilhou ou estamos em outra vertente?
Fuks – 
A parte mais importante da obra de Candido foi escrita numa época peculiar na cultura brasileira, em que se produziram grandes hipóteses sobre a história e a identidade nacional, narrativas sobre tudo o que nos caracterizaria. Esse modo um tanto superlativo de pensar o mundo e a cultura já não prevalece hoje e a crítica tem adotado novos caminhos bastante interessantes, aberta a compreender também o que se excluiu dessas narrativas, a literatura feita por mulheres, a das periferias, entre tantos outros fenômenos. É uma mudança bem-vinda e podemos enxergá-la com bons olhos sem deixar de admirar a potência crítica e a profunda coerência ideológica que marcaram Candido em toda a sua trajetória.

Divulgação

 

Metrópoles – Nos últimos anos, o Prêmio Jabuti, que você recebeu em 2016, vem sendo alvo de muitas críticas por parte da comunidade literária. Você acredita que a premiação deve mudar ou que isso já está ocorrendo de alguma forma?
Fuks – 
Acho que ainda temos muito a evoluir nesses mecanismos de apreciação da produção literária, precisamos dotar esses prêmios de maior rigor e maior abrangência. Mas houve uma evolução com a multiplicação de instituições que os oferecem, e talvez isso venha a ampliar a diversidade dos escritores e escritoras que os recebem. Ainda assim, há algo de mais fundamental anterior a tudo isso, que é a valorização da literatura brasileira para além dessas instâncias arbitrais, a leitura efetiva das obras, a atenção maior aos livros em si, e não às veleidades de um mercado editorial.

Metrópoles – “A Resistência” é um livro que trabalha questões como exílio, memória e uma narração não confiável. É possível perceber na obra um questionamento acerca da identidade nacional, dentro de um contexto de memória coletiva?
Fuks – 
Não diria que o livro propõe uma reflexão sobre a brasilidade, mas sem dúvida tenta ser uma contribuição pessoal a uma memória coletiva, um relato que parte de algo muito íntimo para se fazer histórico e social. Explorar os caminhos trilhados ao longo dos anos por alguns indivíduos, por uma família, é um modo de abordar trajetórias que marcaram nosso continente nas últimas décadas, e compreender como estiveram profundamente marcadas pelo autoritarismo. Pode ser um modo de afirmar mais uma vez o ponto aonde não podemos voltar, um ponto do qual nunca nos afastamos por completo: a violência sistemática de Estado, visível nas cicatrizes tão marcadas que ela deixa.

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