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“Idosa”, Terracap quer renovar quadro com demissões e concurso público

Dos 675 servidores ativos em março, 110 entraram na empresa pública até 1980. Hoje, 16% dos funcionários têm mais de 35 anos de casa

atualizado

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Daniel Ferreira/Metrópoles
Abrão Costa Vale
1 de 1 Abrão Costa Vale - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

As mãos e o rosto enrugados do topógrafo Abrão Costa Vale (foto em destaque) revelam um pouco dos 56 anos dedicados ao trabalho de medição das terras públicas da Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap). Aos 74 anos, ele é o servidor mais antigo do órgão. Vai deixar o serviço público este ano porque a presidência da empresa elaborou um Plano de Demissão Incentivada (PDI).

Assim como Abrão, outros 109 funcionários da Terracap já poderiam ter se aposentado, mas continuam integrando a equipe da agência. Hoje, 16% dos servidores têm mais de 35 anos de casa.

O levantamento foi feito pelo Metrópoles com base nos dados de pessoal disponibilizados no site da Terracap. Foram analisadas as datas de admissão dos 675 funcionários ativos no mês de março. Do total, 110 entraram na agência antes de 1980, ou seja, no ano passado, completaram 36 anos de casa, tempo suficiente para deixarem o emprego segundo as regras atuais de aposentadoria da Previdência Social. Seis desses servidores prestam serviços desde antes dos anos 1970 — 47 anos atrás.

Além do apego à história construída na instituição, eles não querem abrir mão dos benefícios e gratificações que recebem por tantos anos de trabalho. A realidade dos supersalários nas empresas públicas do DF foi tornada pública em fevereiro, quando os órgãos passaram a divulgar os dados.

Embora esses funcionários aportem à agência a experiência acumulada com as décadas de serviço prestado, há outro efeito colateral além das altas remunerações. Segundo o presidente da Terracap, Júlio César Reis, há falta de oxigenação e de oportunidades para que novos profissionais integrem a empresa pública e renovem os quadros.

No atual cenário, apenas 24,2% dos servidores têm diploma universitário. Outros 16,8% concluíram o ensino médio e 58,9% — a maioria dos funcionários — terminaram apenas o nível fundamental.

Renovação
A proposta, agora, é mudar este quadro. Anunciado em setembro do ano passado, o PDI da Terracap convenceu 199 funcionários a optarem pela aposentadoria. Até 31 de agosto deste ano, eles darão lugar a funcionários no começo da carreira. A agência está com concurso público em andamento para o preenchimento de 33 vagas para contratação imediata e 67 para cadastro reserva.

Com essas duas medidas, o presidente da agência espera chegar a 41% do quadro composto por profissionais graduados; 37,5% com nível médio; e 21,3% com o fundamental.

Reis diz ainda que as demissões incentivadas vão render uma economia de R$ 80 milhões ao ano, entre benefícios e encargos pagos atualmente aos servidores que já poderiam estar aposentados. “Estamos nos modernizando para sermos mais eficientes e competitivos no mercado. Esses servidores prestaram um papel relevante à Terracap, mas chega a hora de funcionários mais novos assumirem o serviço”, ressalta Júlio César Reis.

Opção
Foi com a oferta de receber 75% do atual salário — de R$ 28,4 mil — por 27 meses que Abrão Costa decidiu encerrar a trajetória, iniciada em 20 de outubro de 1960, na Terracap. Na verdade, ele já é aposentado desde 1994, mas nunca parou de trabalhar.

“Fiquei porque ainda estava novo, era lucrativo e queria continuar. A Terracap foi a minha vida e representa tudo o que tenho”, conta o topógrafo.

Daniel Ferreira/Metrópoles
O topógrafo Abrão, servidor mais antigo da Terracap, deixará a empresa após 56 anos

 

Mineiro de Unaí, Abrão ingressou no serviço público do DF aos 18 anos, na Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap). No órgão, ele tinha o cargo mais baixo, de “Empregado 1”, uma espécie de faz-tudo.

Quando a Terracap foi criada, no início da década de 1970, Abrão pediu transferência. Com o tempo e observando o trabalho dos colegas, foi promovido a topógrafo, profissão que exerce até hoje.

 

Ao longo desses últimos anos, o ritmo de trabalho foi diminuindo. Apesar de ainda ir para a rua, hoje Abrão só o faz quando substitui alguém. O programa de demissão veio em hora oportuna, e ele decidiu parar. A aposentadoria deve sair ainda no primeiro semestre deste ano.

Não sei o que vai acontecer quando eu levantar e souber que não venho mais para a Terracap. Mas chegou a hora de cuidar da minha família, do meu sítio e de mim

Abrão Costa Vale, funcionário da Terracap há 56 anos
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Décadas de serviço
Histórias como a de Abrão se repetem na Terracap. No setor de transporte, o motorista Moacir Soares tem 73 anos e está na casa desde agosto de 1965. Com seus 51 anos de empresa, alcançou salário de R$ 16,8 mil.

A auxiliar-administrativa Onezilda Sebastiana Costa Santos tem 75 anos e integra o Núcleo de Gestão de Contratos e Convênios Administrativos. No mês que vem, completa 54 anos na Terracap, com remuneração de R$ 13,9 mil.

Outro caso que reforça o quadro antigo de servidores é o de Mires Lopes de Oliveira, supervisora do Núcleo de Arquitetura. Em julho, ela comemora seus 78 anos, sendo 50 deles na Terracap. As cinco décadas na empresa fizeram os vencimentos de Mires chegar aos R$ 15,6 mil mensais.

 

Daniel Ferreira/Metrópoles
Júlio César Reis: “Chega a hora de funcionários mais novos assumirem o serviço”

 

Aposentadoria compulsória
A legislação brasileira determina a aposentadoria compulsória no serviço público aos 75 anos, isso graças à Lei Complementar 152 de 2015. Antes, a idade limite era de 70 anos. “De maneira geral, no Brasil, as pessoas se aposentam no serviço público em torno dos 50, 60 anos. A legislação que obriga a aposentadoria é para evitar a perpetuação nos cargos. Essa realidade apresentada na Terracap não é comum, é invertida”, avalia Eduardo Ramires, especialista em direito administrativo.  

A aposentadoria tardia pode ser justificada por alguns motivos, entre eles o salário, que sofre uma redução. “O ser humano é movido por desafios, e qualquer pessoa que fique em uma mesma área durante 20, 30 anos, perde esse incentivo porque entra na zona de conforto. Ela acaba ficando por necessidades básicas, como segurança e sobrevivência pelo salários e benefícios que tem”, avalia Anna Cherubina Scofano, consultora da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Por outro lado, a professora ressalta o vínculo criado pelo servidor com o local de trabalho e a importância de se sentir útil na sociedade. “A vida da pessoa é essa. Por mais que ela não seja mais tão eficaz, tirá-la de lá é arrancar o que resta para ela, que pode entrar em um processo depressivo. Por isso, há um quê de paternalismo e de humanidade dentro do serviço público”, completa Anna Cherubina.

Aposentadoria
No Brasil, o trabalhador pode se aposentar por idade ou tempo de contribuição. No primeiro caso, os homens devem ter 65 anos e as mulheres, 60. Também precisam ter contribuído com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por, no mínimo, 15 anos.

Já quando o pedido é feito com base na contribuição, são necessários 35 anos de trabalho para os homens e 30 para as mulheres.

Mas a expectativa é de que mudanças ocorram com a Reforma da Previdência. A proposta apresentada pelo governo Michel Temer prevê idade mínima de 65 anos para homens e mulheres se aposentarem.

O tempo mínimo de contribuição subiria de 15 para 25 anos. Pelo novo modelo, para se aposentar com acesso ao benefício integral, será necessário contribuir ao longo de 49 anos.

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