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Em nome de Deus, grupos de teatro salvaram Brasília do vazio pós-1968

Série Teatro 061 mostra a importância do Teatro Espírita de Brasília (TEB), de Irene Carvalho, e do Grupo Via Sacra ao Vivo de Planaltina

atualizado

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Divulgação
Dona Irene Carvalho
1 de 1 Dona Irene Carvalho - Foto: Divulgação

No fim da primeira década de vida de Brasília, o teatro com fins messiânicos teve um papel fundamental para formação de uma geração de futuros intérpretes, diretores e artistas cênicos. Tanto o Teatro Espírita de Brasília (TEB) quanto o Grupo Via Sacra ao Vivo, responsável pela Paixão do Morro da Capelinha, em Planaltina, surgiram, como atividades capazes de suprir o exercício teatral para uma capital que ainda não possuía o palco como atividade profissional.

O ano de 1973, auge da ditadura militar, com a Universidade de Brasília (UnB) completamente desmontada, foi o ponto de virada desses coletivos. Em que pesem os fins catequéticos dessas duas correntes, as experiências cênicas do TEB e da Paixão de Cristo do Morro da Capelinha proporcionaram um salto qualitativo na formação da mão de obra que tentava se ambientar com Brasília.

Fenômeno Irene

É impressionante a organização e a produtividade do TEB, que tinha no comando a médium Irene Carvalho (1923-2017), que psicografava a dramaturgia do espírito de Franco Leal, um médico erudito que teria vivido no Rio Janeiro havia 300 anos.

Irene psicografou 40 textos ditados por Franco Leal. O primeiro deles, “O Encontro”, encantou pela qualidade. O embaixador Vladimir Murtinho gostou tanto que pediu ao TEB para estrear uma montagem na XXVIII Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Assim foi apresentada “O Irmão das Almas”, com direção de Álvaro Heleno e estrelado por Sebastião Deblair. A peça viajou para Paris e o intérprete foi premiado pela atuação.

Dona Irene, como carinhosamente era tratada, cercou o TEB de profissionalismo. Evitou colocar não-atores em cena. Chamou intérpretes e diretores profissionais para criar os espetáculos, que seguiam processos criativos com ensaios e discussões cênicas para a montagem. Passaram pelo TEB nomes como Gé Martú e Verônica Moreno.

O TEB tinha núcleo de produção executiva e captava verbas para patrocínio, ocupando palcos nobres de Brasília, como a Sala Martins Penna. Abriu-se assim um caminho fértil para o coletivo, que chegou a ter patrocínio da Lei Rouanet nos anos 2000, comprovada a qualidade cênica.

O TEB não pretende convencer ninguém, busca apenas promover atividades artísticas e de entretenimento, apontando os caminhos para uma nova consciência de seus espectadores, difundindo a mensagem de um mundo melhor por meio das artes cênicas

As peças “Camila”, “Tinha Que Ser Assim”. “As Margens do Jordão”, “Acorrentados”, “Nhá Hortência”, “Então Doutor” e “A Nova Rica” fizeram circulação pelas principais capitais do país.

Membro da Academia de Letras do Distrito Federal (cadeira 24), Dona Irene era um fenômeno criativo. Além de psicografar as peças de Franco Leal, compunha letras de canções, fazia palestras, produzia e captava.

 

Luciana Martuchelli no programa de “Camila”

 

Um dos maiores sucessos do TEB foi “A Confissão do Padre André” apresentada no Teatro Dulcina de Moraes, além de “Camila” que lotava a Sala Martins Penna. Numa produção de 1995, a “Camila” tinha Luciana Martuchelli como protagonista e Dalton Camargo, na luz.

“Com apresentações nos melhores teatros do Brasil, recebemos diversos troféus de Honra ao Mérito de várias secretarias de cultura por onde passamos. Levamos a mensagem de um mundo melhor, principalmente para o público não espírita.”

Dona Irene

Arte na Capelinha

Preto Rezende como Judas

 

Idealizado pelo padre Aleixo Szim, o Grupo Via Sacra ao Vivo surgiu em Planaltina, com vigor cênico, revelando o talento de Preto Rezende, hoje um dos mais respeitados nomes do teatro do DF. Além de fazer o papel de Judas durante anos, Preto foi coordenador da Paixão e ajudou a formar uma geração de atores.

O ator fundou um importante grupo de teatro no DF, Senta que o Leão é Manso. Nos anos 1980, Preto foi estudar teatro na Faculdade Dulcina de Moraes e chegou com uma cancha de primeira, que arrancou elogios da mestra e de suas discípulas, como Bibi Ferreira e Henriette Morineau.

Imagem da Capelinha de 1943

 

A forma amadora da Paixão de Cristo de Planaltina foi se transformando numa produção profissional. De 100 espectadores no primeiro ano chegou a quase 200 mil fiéis recentemente. Tudo começou com a reforma da Capela, original de 1943, do Morro, em 1972, despertando o desejo do padre Aleixo em realizar a encenação da via Sacra.

“Junto com o TEB, o grupo Via Sacra ao Vivo pode ser indicado como o grupo de maior continuidade dentro da história do teatro de Brasília.”

Eliezer Faleiros de Carvalho

FONTES:
Acervo do Correio Braziliense
“(A)bordar Memórias, Tecer Histórias: Fazeres Teatrais em Brasília 1970-1990”, dissertação de mestrado de Elizângela Carrijo
“A Paixão de Honestino”, de Betty Almeida
“Histórias do Teatro Brasiliense”, de Fernando Pinheiro Villar e Eliezer Faleiros de Carvalho
“Panorama do Teatro Brasiliense em 1968”, artigo de Carlos Mateus de Costa Castello Branco, publicado na revista Intercâmbio
“A Cidade Teatralizada”, de Celso Araújo
“Educação Pela Arte: o Caso Brasília”, de Maria Duarte de Souza
“Canteiro de Obras”, Notas Sobre o Teatro de Brasília, de Glauber Coradesqui

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