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Olhar para os sonhos é conectar-se profundamente com a alma

Os sonhos falam de tudo aquilo que é meu, mas que o eu (ego) não consegue nomear, discriminar, contextualizar

atualizado

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balao Grafite de Banksy
1 de 1 balao Grafite de Banksy - Foto: Divulgação

Imagine se, a cada dia, você tivesse horas privilegiadas, nas quais pudesse se deparar com elementos profundos, que apontam para a solução de problemas ou para novas oportunidades ainda não percebidas.

Agora imagine esse conteúdo sendo dispensado, ou perdido para o esquecimento, ou, pior, sendo tratado como algo sem nenhum valor. Acredite, é bem provável que você faça isso e nem se dê conta. Ou você presta atenção nos recados trazidos por seus sonhos?

Nossos sonhos são chaves para um mundo fantástico, o inconsciente. Ele é formado por todo o conteúdo que, por algum motivo, não conseguimos interpretar a partir da consciência. Ou seja: fala de tudo aquilo que é meu, mas que o eu (ego) não consegue nomear, discriminar, contextualizar. Mas que, mesmo assim, influenciam e até determinam quem sou.

Janela da alma
Aí entram as imagens que se formam durante o sono. Eles funcionam como fotografias desses movimentos que ocorrem além do ego. Apresentam-nos a outros personagens interiores que nos povoam, falam como elaboramos determinados conteúdos temáticos. Sonhos são a fotografia mais fiel da nossa realidade psíquica.

De forma intuitiva, a humanidade sempre percebeu a importância das imagens oníricas para o próprio desenvolvimento. Assim, encontraram diversas formas de observação, registro e interpretação. Nos primeiros hospitais, na Grécia, eram peças importantes para o diagnóstico e para indicar o tratamento mais adequado.

Diversas culturas interpretaram sonhos como um caminho de mediação com a transcendência. Na crença, mostram os deuses que vêm em nosso favor, e os demônios que nos apavoram – as forças desconhecidas que nos regem, que, na Psicologia Analítica, chamamos de complexos.

Processar informações
Os sonhos, por si, já cumprem uma função psíquica importante. Eles ajudam a assimilar os conteúdos vividos. Assim como um processador de um computador. Tanto que, uma pessoa privada de sonhar, em pouco tempo tenderá a apresentar graves distúrbios mentais. Mas vai muito além.

Isso ficou mais evidente quando, no início do século 20, Sigmund Freud colocou a interpretação dos sonhos no centro do processo da análise. Ele foi seguido por Carl Jung, que ampliou esse olhar. Apesar das divergências teóricas, foi com essa observação que ambos determinaram a psicologia contemporânea.

A visão junguiana, que sigo, defende que cada elemento e personagem apresentados num sonho falam de aspectos interiores do sonhador. Eles trazem emoções correspondentes àquelas que predominam nos complexos ali representados. Quando tudo isso forma um enredo, temos uma representação simbólica de algum conflito interno. E, quase sempre, uma solução possível.

Num primeiro momento, parece complicado reconhecer-se dentro de papeis tão diferentes daqueles com os quais nos identificamos (ou seja, com os valores do ego). Mas a prática da análise mostra quantos seres estranhos carregamos dentro de nós. É assustador em alguns momentos. Gratificante em muitos outros.

Caderno dos sonhos
Para quem está em análise, o caderno dos sonhos se transforma numa ferramenta essencial, quase sagrada, para o autoconhecimento. Na sequência de imagens ali relatadas a alma se desnuda, de uma forma tão pura, que muitas vezes o material não é confiado plenamente a ninguém – às vezes nem ao próprio analista.

Com o tempo, olhar para um sonho ganha um novo sabor: o de descobrir o que ainda nos falta, os potenciais que estão negligenciados, os gatilhos para que aflorem os comportamentos de risco, as insistências que nos levam à perdição. Mostram também como a vida pode ser mais fácil, quando estamos em consonância com nossas vozes internas.

* Hoje, às 21h, estarei ao vivo na página do Metrópoles no Facebook para uma conversa sobre sonhos. Acompanhe e participe enviando as suas dúvidas e relatos.

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