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Gasto com pessoal consome 60% da receita dos estados

De 2010 a 2016, a participação do quanto esses gastos abocanham de todo o montante arrecadado cresceu 6,9 pontos porcentuais

atualizado

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Daniel Ferreira/Metrópoles
Notas de dinheiro – Brasília(DF), 06/10/2015
1 de 1 Notas de dinheiro – Brasília(DF), 06/10/2015 - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

O crescimento dos gastos com Previdência Social foi um dos fatores que contribuíram para a explosão das despesas com pessoal nos estados. De 2010 a 2016, a participação do quanto esses gastos abocanham de todas as receitas arrecadadas cresceu 6,9 pontos porcentuais, para 59,8%. Isso significa que de cada R$ 100 que os estados arrecadam, R$ 60 pagam despesas com funcionários, aposentados e pensionistas.

A secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, considera o número elevado. Ela destaca a velocidade desse processo de desequilíbrio fiscal que pode agravar a já delicada situação das finanças estaduais em um contexto de queda de arrecadação. “A consequência disso foi a compressão de investimentos e o aumento dos desequilíbrios nos orçamentos”, explicou a secretária.

Diante dessa ampliação nas despesas com pessoal, nove estados ultrapassaram em 2016 os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para esses gastos. O teto equivale a 60% da Receita Corrente Líquida (RCL), mas Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Mato Grosso, Goiás e Rio Grande do Norte destinaram mais que isso ao pagamento de sua folha no ano passado.

Minas Gerais lidera os gastos, com 78,76% de sua RCL comprometida com pessoal. Uma situação altamente alarmante e que sufoca a capacidade de o governo estadual oferecer os serviços essenciais que são de sua responsabilidade, como educação e policiamento.

Apenas dois estados usam o mesmo método do Tesouro para fazer esse cálculo: Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte. O restante recorre a subterfúgios, muitas vezes patrocinados por seus Tribunais de Contas Estaduais (TCEs), para maquiar as contas e descontar despesas que deveriam ser consideradas como de pessoal.

“Há diferenças de apuração e precisamos trabalhar juntos pela convergência”, ressaltou. Esse alinhamento é ainda mais importante para aqueles que pretendem aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). “Temos de estar na mesma página do ponto de vista contábil.”

Estados com pesadas despesas com servidores inativos, a exemplo do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul precisaram adotar medidas de aperto, como a elevação da contribuição previdenciária, e estão hoje na fila por socorro da União.

O governo fluminense já protocolou o pedido de adesão ao RRF e a administração gaúcha está em tratativas para a elaboração do plano de recuperação.

Pelos dados do boletim, apenas um estado hoje está habilitado a aderir ao RRF, que é o Rio de Janeiro. Ironicamente, o Rio Grande do Sul, que já está em negociação para ter o socorro, precisará antes reconhecer que seus gastos com pessoal têm pesado mais para sua grave situação fiscal do que mostram os dados do próprio estado.

Avanços
Apesar desse quadro, o Tesouro observou que a situação financeira dos estados melhorou no ano passado, e eles conseguiram adiar menos despesas. Os atrasos e deficiências que chegaram a R$ 19,9 bilhões em 2015 caíram a R$ 13,7 bilhões no ano passado.

“Diminuiu o grau de postergação de despesas para o ano seguinte”, avaliou. Segundo ela, houve um esforço na contenção de despesas com servidores ativos, o que contribuiu para a melhora nas contas. Em média, o gasto com a folha caiu 3,07% em termos reais em 2016 em relação ao ano anterior.

“O que observamos é que a situação dos estados melhorou, mas isso não indica uma melhora definitiva”, concluiu.

Apesar dos esforços dos estados para conter os gastos com servidores ativos no último ano, essa despesa tem tido crescimento acelerado nos últimos anos. Na média, o avanço real, já descontada a inflação, foi de 23,7% de 2010 a 2016.

Esse aumento no gasto com a folha foi liderado por Mato Grosso, Minas Gerais e Rio de Janeiro, onde essas despesas cresceram mais de 40% acima da inflação no mesmo período.

Na edição do boletim com dados de 2015, oito estados estavam desenquadrados nos gastos com pessoal segundo o Tesouro Nacional, mas apenas um reconhecia essa realidade. Havia ainda a situação irônica do Tocantins, que dizia extrapolar o limite, o que não ocorria de fato nas contas do governo federal.

Rombo
Os estados declararam no ano passado um rombo R$ 30 bilhões menor na Previdência do que o apurado pelo Tesouro Nacional. O boletim anual que será divulgado nesta quinta-feira mostra que os governos regionais informaram déficit de R$ 55 bilhões com o pagamento de aposentadorias e pensões, mas o Tesouro detectou que o rombo é de R$ 84,4 bilhões. A prática é condenada pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Embora usem uma contabilidade diferente, os estados referendaram os cálculos do Tesouro. A União faz um acompanhamento anual das contas estaduais para a renegociação de dívida. E, dentro desse programa de acompanhamento, os Estados admitiram que há diferenças nas informações.

“Há diferenças de apuração e precisamos trabalhar juntos pela convergência”, destacou Ana Paula Vescovi. “Temos de estar na mesma página do ponto de vista contábil.”

O presidente do Comitê de Secretários de Fazenda dos Estados (Comsefaz), André Horta, reconhece que há divergências com o Tesouro sobre a classificação de determinadas despesas, mas diz que os governos estaduais trabalham para adequar as estatísticas. A renegociação da dívida dos estados previu alguns dispositivos para tentar tornar essa contabilização menos desigual. “O mais correto, provavelmente, é algo entre os dois (modelos)”, sugere Horta.

Gravidade
O mais grave é que a conta para o futuro também está subestimada. Surpreendentemente, o rombo nas contas da Previdência dos estados já é maior do que as previsões feitas para os próximos anos pelos próprios governos regionais.

“As decisões do presente podem estar sendo turvadas por essas estimativas, que estão minimizando o problema”, adverte a secretária do Tesouro. Na sua avaliação, o retrato mais fiel da realidade dos estados ajuda na tomada de decisões para resolver os problemas. Hoje, as dificuldades estão escondidas por números irreais.

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